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Você se considera ocidental?

Eu costumava dizer que sim. Até por uma questão geográfica – Europa, Américas e uma pequena parte da África seriam do Ocidente; dessa linha imaginária em diante seria o exótico Oriente. O Oriente das Índias, da China e do Japão. Enfim, o famoso “outro lado do mundo”. Mas então como explicar a Austrália e a Nova Zelândia, ocidentais mesmo estando do lado de lá? Ou a Itália e a Grécia, berço do mundo Ocidental, mas que estão do lado Oriental desse muro imaginário que nos separa?

E tem mais: quase todo brasileiro urbanizado e de classe média se sente ligado à cultura ocidental, afinal crescemos ouvindo músicas, vendo filmes e acompanhando séries norte-americanas e europeias. Mas os autores dessas produções não sentem a mesma coisa. Pergunte para um inglês, um norte-americano ou um alemão se o Brasil faz parte do mundo ocidental. É muito provável que você se surpreenda com um tremendo não, afinal para eles brasileiros é que são exóticos. Tão exóticos quanto os orientais.

Cristo Redentor, Rio de Janeiro

Rio de Janeiro

O escritor Alex Castro conta que, ao dar aulas numa universidade dos Estados Unidos, recebia inúmeros alunos no curso de literatura brasileira, gente que ia em busca de quatro créditos de uma disciplina sobre culturas não-ocidentais. E, pelas regras da universidade, literatura brasileira preenchia esse requisito.

Já o jornalista Guga Chacra disse que passou por uma situação parecida quando estudou nos Estados Unidos e lembrou que no Conselho de Segurança da ONU o Brasil nunca é tratado como país ocidental, mas como um dos BRICS. E a também jornalista Gisela Anauate, que mora na França, contou que professores e colegas europeus também não enxergam o Brasil como um membro do clube ocidental.

Mas você nem precisa viajar ou conversar com um gringo para perceber isso. Basta perguntar ao Google. Digite “países ocidentais” na aba de notícias, de preferência em inglês (western countries), e veja se o Brasil aparece entre os citados. Eu não achei.

Por outro lado, encontrei um artigo da britânica The Economist que nos coloca bem longe do ocidente:

“A chegada da China melhorou a infraestrutura da África. (…) Outros países não-ocidentais, como Brasil, Turquia, Malásia e Índia, estão seguindo esse caminho”.

Centro histórico de Salvador

Salvador, Bahia

É mais do que uma questão geográfica

O conceito de ocidental não tem nada a ver com o Meridiano de Greenwich, que só foi estabelecido em 1851 e passou a separar o mundo geograficamente entre Oriente e Ocidente. A visão de mundo é muito mais antiga do que essa convenção. Ela já existia quando a Grécia era comandada por Alexandre, que dominou os persas, os egípcios, os babilônios e os indianos, todos orientais.

Foi após Alexandre, que espalhou a cultura grega pelo planeta, que a ideia de dois mundos começou a nascer. Até que veio o Império Romano, expandiu o mundo de Alexandre, mas por fim acabou dividido entre Império do Ocidente (Roma) e Império do Oriente (Constantinopla, hoje Istambul).

Séculos mais tarde, já na Guerra Fria, Ocidente e Oriente foram divididos pelo sistema político. Capitalista? Vai pro balaio ocidental. Comunista? Entra no montinho Oriental. Isso explica como Cuba, mesmo a 100 quilômetros de Miami, dificilmente seria considerada Ocidental por alguém. Por falar nisso, e Miami, hein? Tão hispânica assim, será que faz mesmo parte do Ocidente?

Hoje, com o fim da divisão do mundo em três – 1º mundo, 2º mundo e 3º mundo – a visão de Ocidental é uma mistura de dinheiro, política, religião e cultura. Países que tenham tido forte influência religiosa cristã costumam ser colocados como ocidentais. Muçulmanos, hindus e budistas são o Oriente. Só não vale lembrar que o cristianismo nasceu no Oriente Médio, exatamente no mesmo lugar que nasceram o islamismo e o judaísmo – aí a confusão toma conta da conversa.

E, mesmo com toda a importância que o cristianismo teve na América do Sul, o conceito atual de ocidente envolve necessariamente países desenvolvidos, independente da posição geográfica: Estados Unidos, Canadá, Inglaterra, França, Alemanha, Austrália e Nova Zelândia são ocidentais. Brasil, Argentina, China, Índia, Malásia, Chile e Turquia não são.

faria lima são paulo

São Paulo

Se não somos ocidentais, então somos orientais?

Claro que não. Durante o quase um ano que vivi na Ásia, tinha certeza que os brasileiros eram tratados como exóticos, simpáticos e como parte de outro mundo. Mas para o Oriente esse mundo não era o Ocidente.

Logo após o fim da Guerra Fria, o cientistas político Samuel Huntington publicou o livro “O Choque de Civilizações e a Reconstrução da Ordem Mundial”. Nele, Huntington dividiu o mundo em oito grandes civilizações: hindu, chinesa, japonesa, islâmica, budista, ortodoxa, subsaariana, ocidental e latino-americana.

Sim, somos latinos. Apesar da língua, é impressionante a quantidade de semelhanças que temos com nossos vizinhos argentinos, chilenos, uruguaios, paraguaios, colombianos, venezuelanos (e todo o resto da América do Sul). Todos temos influência cristã, língua ibérica e problemas sociais típicos de nações em desenvolvimento.

Dicas-viagem-Peru

E os peruanos? São ocidentais?

Isso importa?

Separar o mundo entre Ocidente e Oriente acabou não dando conta das diferenças contadas aos bilhões. A mesma coisa acontece com a divisão em oito partes. Por isso, acho que no fundo a importância do rótulo de ocidental, oriental ou latino-americano é só essa mesmo: a de rótulo. Importa mais para os livros de geografia do que para a vida real.

Afinal, a vida real de um indiano de classe média é bem parecida com a vida de um brasileiro ou norte-americano de mesmo nível social. Há diferenças, claro: o indiano pode ser budista ou hindu, enquanto o brasileiro tende a ser cristão, por exemplo. Mas também é possível que um brasileiro budista um dia trombe com um indiano cristão, afinal essas diferenças se dão no plano pessoal.

subida buda gigante de Hong Kong

Buda Gigante em Hong Kong

Para mim, disso tudo ficam duas questões importantes: por que nós, brasileiros, muitas vezes nos sentimos mais próximos do mundo ocidental que do mundo latino?

Passei cerca de dois meses na Argentina, logo depois da Copa do Mundo. Desembarquei em Buenos Aires menos de 24 horas depois da Argentina perder para a Alemanha e com o país num clima de enorme frustração. Assim que desembarcamos, o taxista que nos levou ao hotel fez questão de perguntar: “Por que vocês brasileiros não se sentem latinos?”.

Caminito, Argentina

Buenos Aires, Argentina

A pergunta era uma provocação, principalmente porque os argentinos não entendiam como brasileiros preferiram torcer contra a Argentina (e a favor da Alemanha, a inimiga do 7 x 1). Mas, mesmo feita num momento de rivalidade entre os dois países, a pergunta tem o seu fundo de verdade: brasileiros se sentem menos parte da América Latina do que nossos vizinhos. Até por uma questão de idioma. Até por uma questão de colonização, já que o único país colonizado por portugueses virou um Império independente, enquanto a América espanhola se dividiu em várias repúblicas. Mesmo com essas diferenças, é preciso lembrar: somos latinos.

A outra pergunta, talvez ainda mais interessante, envolve conceitos de oriental, ocidental e latino-americano, entre outros: o que é uma cultura exótica? Por que classificamos assim aqueles que são diferentes da gente? Seria exótico tudo que é oposto ao que julgamos ser cultura ocidental?

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Rafael Sette Câmara

Sou de Belo Horizonte e cursei Comunicação Social na UFMG. Jornalista, trabalhei em alguns dos principais veículos de comunicação do Brasil, como TV Globo e Editora Abril. Sou cofundador do site 360meridianos e aqui escrevo sobre viagem e turismo desde 2011. Pelo 360, organizei o projeto Origens BR, uma expedição por sítios arqueológicos brasileiros e que virou uma série de reportagens, vídeos no YouTube e também no Travel Box Brazil, canal de TV por assinatura. Dentro do projeto Grandes Viajantes, editei obras raras de literatura de viagem, incluindo livros de Machado de Assis, Mário de Andrade e Júlia Lopes de Almeida. Na literatura, você me encontra nas coletâneas "Micros, Uai" e "Micros-Beagá", da Editora Pangeia; "Crônicas da Quarentena", do Clube de Autores; e "Encontros", livro de crônicas do 360meridianos. Em 2023, publiquei meu primeiro romance, a obra "Dos que vão morrer, aos mortos", da Editora Urutau. Além do 360, também sou cofundador do Onde Comer e Beber, focado em gastronomia, e do Movimento BH a Pé, projeto cultural que organiza caminhadas literárias e lúdicas por Belo Horizonte.

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53 comentários sobre o texto “Você se considera ocidental?

  1. Excelente post!
    Creio que realmente não há sentido em separar em oriental e ocidental.
    Mas verdade seja dita, os brasileiros são os que se sentem menos latinos de toda a América Latina.
    Apesar de fazer fronteira com quase 7 países de língua espanhola, como segunda língua se prefere o inglês, alguns tem aversão total ao espanhol, mas é realmente muito difícil achar alguém que tenha aversão ao inglês (podem achar difícil de aprender, mas aversão não!).
    Isso é em relação a tudo! Música então, nem se fala!

    1. Sim, há a berreira da língua espanhola. Mas é engraçado como a língua inglesa parece não ser uma barreira para muitos de nós, né?

      Abraço.

  2. Meu professor na graduação de RI uma vez perguntou pra turma se o Brasil era parte do ocidente,a resposta foi um sonoro “CLARO!” Hahahaha Como estávamos enganados ! Ser um país ocidental é a mesma coisa que ser um país de maioria branca, capitalista, desenvolvido, cristão católico ou protestante (apesar de uma pequena parte atéia) e herdeiro cultural e político da grécia, por isso a Austrália e a Nova Zelândia são ocidentais e nós ,assim como os Indianos,Chineses e Árabes, não o somos.
    O Brasil sempre tentou,principalmente durante o Império, se distanciar de nossas origens indígenas/africanas e se ater a parte européia da nossa formação, afinal ser branco e europeu era sinônimo de civilização ! Parece que ainda não superamos essa fase… por quanto tempo mais taparemos o sol com a peneira antes de começar a valorizar o que é nosso e reconhecer nossa afinidade com a América do Sul, Central e a África? Os Brics foram um passo importante para que ao menos o nosso governo parasse de brincar de fazer parte do clubinho presidido pela união européia e os EUA e tentar formar e fortalecer sua própria turma ( o que não significa de forma alguma cortar relações com o clube desenvolvido,mas somente usar dessas relaçoes com inteligência), mas ainda temos muito chão a percorrer…

    1. Cristina, uma coisa é termos afinidade e interesses econômicos comuns com outros países emergentes, outra coisa é a nossa colocação dentro da civilização ocidental. As afinidades a gente escolhe, a herança cultural a gente não escolhe – é História. O tempo não volta atrás.

      Se o fato de termos influências não-européias na formação de nosso povo aparta-nos do mundo ocidental, então, pelas mesmas razões, os EUA deveriam ser considerados não-ocidentais. Mas é claro que ninguém afirma isso. Ao contrário, já ouvi muitos americanos comentarem que não consideram certos países europeus como membros do mundo ocidental, que na visão deles, compreenderia somente a chamada anglo-esfera – o Reino Unido e suas ex-colônias. É a opinião deles.

      A verdade é que a auto-exclusão da América Latina do mundo ocidental esconde um excesso de nacionalismo de nossa parte e uma revolta algo pueril contra os antigos colonizadores, tidos como opressores e saqueadores de nossas riquezas – assim, valorizar nossa herança não-européia seria uma forma de expulsar os invasores e resgatar nossa suposta identidade. Muitos apregoam isto movidos por um sentimento de culpa pela opressão passada sofrida por ameríndios e africanos. Mas a verdade é que uma herança cultural não-européia, neste continente, só é presente em umas poucas regiões da América Central e dos Andes, onde os povos pré-colombianos eram evoluídos e suas tradições sobreviveram até os dias de hoje. No restante, Brasil inclusive, os povos originários eram primitivos e de sua cultura só restaram vestígios. Nós, brasileiros, sejamos brancos, pretos ou caboclos, ou temos uma formação cultural de origem européia, ou somos simplesmente ignorantes.

      Na extremidade oposta – na Europa e nos EUA, ou seja, no mundo desenvolvido – a exclusão da América Latina do mundo ocidental reflete um sentimento de vergonha por compartilhar o mesmo contexto civilizacional com países pobres. Como diz o ditado, filho feio não tem pai. Se a América Latina faz parte do mundo ocidental, então o mundo ocidental não é 100% composto por países ricos, e isso é desagradável de admitir. Mas se a América Latina é excluída do mundo ocidental, então o problema está resolvido. Sob este enfoque, o conceito de mundo ocidental perde toda a sua conotação étnica e cultural, e torna-se um paradigma, na prática reduzido a sinônimo de primeiro mundo: quem é rico é ocidente, mesmo se for o Japão (muitos o incluem no mundo ocidental). Mas eu acho que nós não devíamos engolir isso.

  3. Caramba! Nunca tinha parado para pensar nisso! Não vou mentir que eu sempre tive um carinho e uma atração pela Oceania e Europa e sempre achei que 90% dos brasileiros querem ser americanos ¬¬ HOJE estou terminando o curso de arqueologia bacharelado e minha percepção mudou…estou apaixonada pela américa latina e pela cultura dos paleoíndios!! E morro de ÓDIO quando escuto: ahh…os portugueses descobriram o Brasil”…PQP e os paleoíndios??? O que mais discutimos nas aulas é o pq o brasileiro não se identifica com os índios e os negros =( Enfim, hoje eu amo a América Latina e a África! =***

    1. Uma coisa que diferencia muito o Brasil de outros países latinos é o orgulho das sociedades pré-colombianas.

      No Peru, na Bolívia, no Chile e até na Argentina e no Uruguai: todos têm orgulho dos incas e de outros povos que habitaram o continente.

      Até a bandeira da Argentina tem aquele sol, alusão aos incas.

      Enfim, concordo com você. Não entendo como o brasileiro pode se identificar tão pouco com as culturas indígenas e africanas.

      Abraço.

      1. Rafael, não há nenhuma contradição em que os brasileiros se identifiquem pouco com as culturas indígena e africana. Elas formam uma parte muito pequena de nossa identidade. Não são como os incas, que eram evoluídos e deixaram uma significativa herança aos povos andinos, ou como os afro-descendentes do Caribe, que mantiveram grande parte das tradições de seus antepassados e inclusive falam dialetos originados destes. No Brasil, a exaltação de nossa herança índia e africana é mais parte de um ideário politicamente correto, muito movido por um sentimento de culpa pela opressão sofrida no passado por estes povos.

        1. “não há nenhuma contradição em que os brasileiros se identifiquem pouco com as culturas indígena e africana. Elas formam uma parte muito pequena de nossa identidade.”

          Com isso vc se refere à Rio, SP e outras capitais, nas regiões de classe média e alta, nao é? Porque se for pensar no Brasil como um todo, é impossível dizer que a influência indígena e africana é pequena.

          1. Na verdade é. Muito do ódio aos europeus por parte dos latinos, principalmente pelos hispânicos, é uma coisa artificial e muito recente, criado pelo nacionalismo ufanista e o politicamente correto por influência de partidos socialistas, que tentam inventar uma espécie de inidentidade nacional artificial, que exclua os valores civilizacionais europeus.

            O brasileiro médio, pobre, classe baixa, média e alta, se identifica totalmente com valores ocidentais (o termo correto devia ser europeu), pela cultura, pela religião e pela língua.

            O problema começa porque o termo “Ocidental” já perdeu o sentido há séculos. Originalmente, os Romanos se viam como ocidentais, e considerava os gregos orientais. Enquanto os Gregos se consideravam ocidentais, e os outros povos ao leste e sul orientais. Quando os romanos se cristianizaram (cristianismo é uma religião oriental) seu império se espalhou muito mais rápido pela via de conversão do que pela força militar.

            Quando Roma finalmente civilizou os europeus (a maioria eram povos tribais) e tornou-se um continente com uma única cultura e religião, eles todos passaram a se ver como ocidentais, porém, excluindo os cristãos ortodoxos, de tradição helênica (não romana).

            Ou seja, Ocidente, até essa época, era sinônimo de europeu. Após o fim do império romano e a reforma protestante, os países europeus começaram uma corrida nacionalista, que exponenciava, e muito, o conceito imperial da época. Quando estourou a primeira guerra isso ficou ainda mais acentuado. Quando veio a segunda guerra já havia o conceito de “ocidente vs oriente”.

            Ao final da guerra, no surgimento da guerra fria, os países aliados da segunda guerra se uniram num pacto político-militar anti-soviético. Mas isso acabou pervertendo ainda mais o conceito de Ocidente, que acabou se tornando sinônimo de América do Norte e Europa.

            Eu não acho que isso tenha a ver com discriminação ou racismo (não nessa época), tanto que quando criou-se o conceito de primeiro, segundo e terceiro mundo, ele tinha uma conotação política de alinhamento anti-comunista ou pró-comunista.

            Muito tempo depois é que “Ocidente” acabou virando sinônimo de Europa e países anglo-saxão não europeu, o que não tem lógica, pois, em particular, os próprios americanos, se chamavam de americanos pois se viam no continente americanos, eles não se viam como europeus. Aliás, os americanos se viam como como americanos, enquanto os povos latinos se viam por seus respectivos países. Mas aí os conceitos se inverteram.

            Isso foi uma lástima par todos nós, pois praticamente exclui os países latinos de tradição cultural europeia (mesmo países como maioria branca como Argentina e Chile — o que mostra que não tem nada a ver com raça), que retroativamente acabou ajudando na fomentação de um nacionalismo artificial pelos latinos, nacionalismo esse que buscava reencontrar valores nacionais que não era de tradição europeia, que nem existem.

            E pra terminar, além de não ter nada a ver com raça, também não tem nada a ver com riqueza, pois os países europeus já eram desenvolvidos antes da deturpação desses conceitos, incluso os norte-americanos.

            O que explica que países pobres na Europa não façam parte do termo moderno “Ocidental” é porque eles faziam parte do bloco soviético, encabeçado por Rússia, considerado um país oriental, embora de cultura também europeia e cristã (ortodoxa). São pobres porque o comunismo simplesmente não gera riqueza. Polônia, Ucrânia, e outros países eslavos ao leste, são pobres por causa disso. Não foram considerados ocidentais por formalismo político da Guerra Fria.

            Tecnicamente falando, Ocidente ou Oriente, pouco importa. O que importa é saber identificar a cultura e sua herança histórica. E vale lembrar: capitalismo não é cultura, nem ideologia. Ele não é uma definição social nem cultural por si. É um sistema econômico que, acredite se quiser, acontecia até na União Soviética.

    2. Izabella, uma coisa é você se identificar com índios e negros, outra coisa é você negar que tenham sido os portugueses os descobridores do Brasil. Pois o Brasil, como identidade política, social e cultural, começou a existir quando os portugueses aportaram aqui. O que havia antes aqui não era o Brasil, mas uma região geográfica. O conceito de estado-nação surge na Europa do século 18; os paleoíndios tinham uma organização tribal, e os africanos sequer pediram para ser enviados para cá.

      Goste você ou não dos portugueses, é graça a eles que você existe, e deles veio a ciência que você aprendeu, e que permitiu-a descobrir os paleoíndios, que não conheciam a arqueologia e nunca tiveram qualquer interesse pelo passado remoto dos povos que habitavam os territórios que eles conquistaram pela força.

      1. Olá, Pedro!!
        Então respondendo ao seu comentário =)
        Eu não disse que não gosto dos portugueses(pelo contrário sou apaixonada pela cultura e o país)! Não estou negando que foram eles que descobriram(até pq não tem como)! O que me chateia é o fato dos brasileiros não se identificarem e não reconhecerem a cultura antes da colonização, entendes? É isso que me deixa triste, mas enfim eu sei que amo a arqueologia pré-colonial e também amo a arqueologia histórica! E acho que os brasileiros devem dá mais valor a nossa cultura! No mais é isso e espero que não tenhas me entendido mal! =)
        Abraço!

  4. Ótimo post! 🙂 Confesso que nunca tinha parado pra pensar nessa questão até conversar com um amigo francês, quando morava em Lyon, e ele comentar que pra ele o Brasil não era ocidental. Meu primeiro pensamento foi “comoassim???”, mas daí parti pra uma reflexão parecida com a que você fez e concordo com a conclusão do post.

    Especialmente com o fator “latino”. Quando fui pra Valladolid, minha bolsa era pra América Latina e só éramos duas brasileiras mais um monte de gente de outros países; a maioria conhecia cantores, novelas e fatos históricos dos países uns dos outros e a gente ficava boiando. Somos mesmo meio “ilha”, apesar de termos tantas fronteiras em comum; o que me parece uma grande pena e tenho tentado reverter, a nível pessoal… Outro exemplo é a história dos estudantes de Ayotzinapa: o México está de cabeça pra baixo e a América latina está solidarizando-se cada vez mais, mas o Brasil continua por fora.

    Acho que além de outras tantas questões, isso que Laís falou sobre a língua tem muito a ver mesmo: eu tava semana passada num fórum que reuniu gente de 71 países, incluindo uns 10 latino-americanos. Quando um cara do Peru encontrava um da Costa Rica, por exemplo, eles imediatamente trocavam do inglês pra o espanhol e já rolava outro tipo de identificação. Acabei me aproximando bastante desse grupo, mas se eu não soubesse espanhol, não sei se me integraria do mesmo jeito…

    1. Pois é, Luísa.

      Na Argentina, durante os 3 meses que passei lá, fiquei impressionado ao notar o tanto que eles sabem sobre o Brasil. Conhecem nossas músicas, nossos filmes, nossas novelas, nossa história, nosso futebol.

      E a gente? Sabemos tanto assim sobre nossos vizinhos?

      Abraço.

    2. A nossa falta de afinidade com os demais povos latino-americanos é mesmo uma questão de língua. O idioma é a camada mais elementar da identidade cultural.

      Mas tanto nós quanto os hispano-americanos são membros do mundo ocidental, produto de uma colonização européia. Acredito que apenas comunidades descendentes de índios andinos ou meso-americanos, ou afro-descendentes do Caribe que falam dialetos africanos, possam ser considerados não-ocidentais. Luísa, não ache estranha a opinião daquele francês de Lyon: conforme eu expus no post acima, muitos europeus e norte-americanos negam-se a reconhecer que a América Latina seja parte do mundo ocidental porque têm vergonha de compartilhar o mesmo contexto civilizacional com países pobres. Há também aí um complexo neo-colonial, eles gostam de nos ver como índios porque assim recriam a dicotomia Civilizado X Selvagem. Eu penso que você não percebeu de todo o que estava por trás da posição do francês com quem você comentou, mas alguma coisa deve ter intuído, porque ficou perturbada na hora. Espero que da próxima vez você lhe dê a resposta merecida. Ou considera justo que nossos avós europeus bastardizem-nos e neguem que somos herdeiros de sua civilização?

      Em tempo: diga a esse francês que muitos norte-americanos também negam que a França seja parte do mundo ocidental, e olhe bem como vai ficar a cara dele.

  5. Sou ocidental, crista, latina, brasileira, mas também portuguesa, amazônida,
    cabocla do Pará, quase um ser da floresta! Sou tudo isso junto e misturado e nosso mundão não seria diferente. Um grande caldeirão cheio de misturas. Nós é que ficamos aqui tentando rotular e enquadrar as coisas. Acho que pra fins didáticos, pode até ter alguma utilidade, mas pra vida, não!

  6. Tenho essa discussão direto com minha amiga do Equador e posso dizer que se nós não nos sentimos latinos, tampouco o pessoal da “América espanhola” nos considera latinos. Me surpreendi com quantas músicas temos traduzidas tanto do português para o espanhol como vice-versa (incluindo grandes sucessos como ragatanga e na boquinha da garrafa hahaha)

    1. É a questão do idioma. Já passou da hora do brasileiro se interessar tanto em aprender espanhol quanto já faz com o inglês.

      Abraço!

  7. Esse post me fez lembrar de que quando morei na França, toda festa brasileira tinha muita música latina: salsa, mambo etc etc. E aí eu ficava: essa festa não é brasileira, é latina. Festa brasileira com música em espanhol não é festa brasileira. Acho que a língua é a principal barreira. A gente precisa entender, sentir o que é dito pra ter o sentimento de pertencimento. Eu lembro como me sentia “em casa” ao falar português com brasileiros que nunca tinha visto na vida. Isso não aconteceria se encontrasse uns venezuelanos. Eu não conseguiria nem me comunicar e isso cria um muro entre nós.
    Você que morou na argentina sabe dizer se eles se identificam com músicas “latinas” mesmo que sejam de outros países?
    Interessantíssimo esse post 🙂

    1. Eles adoram as músicas brasileiras, Laís. Gostam muito. E das novelas e filmes brasileiros também.

      A língua pode até ser diferente, mas outras coisas são mais ou menos iguais. Notei isso logo depois que voltei da Ásia, depois de passar 10 meses por lá. Assim que pisei em Santiago, no Chile, me senti em casa.

      Sei lá, as pessoas latinas são diferentes, tem algo marcante. Não que seja melhor ou pior, só é mais parecido com a gente.

      Abraço.

      1. Estou lendo todos os comentários para aprender mais, pois tb achei o artigo muito bom, inovador, pois nunca tinha lido nada parecido. Vi as discussões acerca de ser isso ou aquilo, mas para mim hoje o conceito deveria ser outro: independentemente de colonização, hoje está tudo muito misturado EM QUALQUER LUGAR, língua tb não parece uma barreira tão ruim assim, pois em quase todo lugar tem a língua inglesa como segunda língua e nem por isso existe uma briga acirrada disso e pelo que converso, todos querem aprender uma terceira ou quarta língua. Considero legal as raízes, mas a sociedade se recria, se transforma e cria suas identidades e depois as recria de tempos em tempos… Para mim não faz sentido nos separarmos culturalmente, até porque existe uma imigração muito grande em boa parte dos países, ocidentais ou orientais. Não tenho tanta experiência assim, mas já fui para França, Itália, Grécia e Austrália onde tive oportunidade de estudar com pessoas do mundo todo (as novelas brasileiras são conhecidas até na Eslovênia) e vemos que somos todos humanos simplesmente, então, esse negócio de Ocidental, Oriental, Latino etc., e inflar os ânimos por conta disso, é mais um retrocesso, estaria na hora de tirar esses rótulos e não brigar para que permaneçam, estamos caminhando para nos tornar cada vez mais próximos e iguais – não é isso que tentam as leis defender em todo mundo?…

        1. Oi, Diana.

          Obrigado pelo comentário. Depois leia também o texto do Alex Castro, no Papo de Homem. Ele abordou o tema antes da gente e merece os créditos por isso. 🙂

          https://www.papodehomem.com.br/brasil-pais-ocidental/

          Concordo com o que você disse. E até torço por isso, para que essas barreiras, esses rótulos, sejam derrubadas a cada dia. Eu acho que o que mais mexe com os brasileiros, ao ler este texto, envolve outra coisa: nós somos vistos lá fora como exóticos, da mesma forma que os orientais. Como um grupo distante, não-igual, não-irmão. E muita gente fica ofendida com isso. Acho que não é para tanto, francamente.

          Depois leia esse texto aqui também:

          https://www.360meridianos.com/2014/12/o-que-significa-ser-exotico.html

          Abraço e mais uma vez obrigado por participar do debate.

  8. Essa semana estava pensando sobre esse fato de nós brasileiros não nos sentirmos latinos. Por exemplo, são poucos os brasileiros que escutam ou conhecem as músicas tocadas nos outros países da América Latina. Claro que tem a questão da colonização e principalmente do idioma como vocês falaram, porém, toda semana milhares de músicas em inglês são tocadas em rádio, baladas ou seja lá onde for. Vai entender… uashuahaush
    Ah, muito interessante o post!

    1. Nós brasileiros, não nos sentimos latinos?

      O correto é dizer que nós, brasileiros, não nos sentimos hispano-americanos, mas isso tem uma explicação simples: o idioma. Nós falamos português e eles falam espanhol. Mas de resto tanto nós quanto eles somos igualmente latinos, no sentido de que descendemos de povos sul-europeus que falam uma língua originada do latim, tal como os franceses, belgas, franco-suíços, italianos e romenos. O Latium ficava na Itália central; portanto, nossa herança latina é um atributo que nos liga com nossos ancestrais europeus, e não como nossos primos sul-americanos. Tipificar a latinidade como um atributo sul-americano e oposto à Europa é uma deturpação grosseira do sentido das palavras.

      1. Pedro,

        Só vi esse seu comentário meses depois, francamente. Desculpa por isso.

        Olha, pode até ser que você tenha razão nisso (“Tipificar a latinidade como um atributo sul-americano e oposto à Europa é uma deturpação grosseira do sentido das palavras”).

        Mas não é, hoje em dia, a expressão “latino” muito mais ligada à América do que à Europa, de onde a cultura latina se originou? Não estou dizendo que essa não seja a origem do termo, que os latinos não vieram da Europa, etc. Mas procure na mídia: latino, hoje em dia, é mais uma referência à cultura que nasceu na América do que a países europeus.

        Pode ser uma deturpação grosseira dos sentidos das palavras. Ou pode ser que o sentido das palavras mude com o tempo, com o contexto histórico, cultural e até textual. Você, por exemplo, entendeu o que eu falei no comentário acima. Só discordou, pelo que eu percebi, do termo.

        Enfim, obrigado por estar participando do debate. Mesmo discordando em alguns momentos, suas intervenções são muito proveitosas ao tema.

        Abraço.

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