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Belo Horizonte é incrível – eu só demorei para perceber isso

Passei tanto tempo sonhando em conhecer outras terras que demorei para perceber que o mundo inteiro cabe na minha cidade. E olha que Belo Horizonte, onde nasci, cresci e voltei a viver há dois anos, tem a fama de ser um ovo, ditado que todo belo-horizontino conhece e já comprovou. E isso não é ruim, afinal o ovo é o ingrediente fundamental do tropeiro, que é uma das comidas essenciais de BH, da birosca da esquina ao estádio de futebol. Mas deixemos o tropeiro para mais tarde.

Em 2011, quando eu não conhecia muita coisa além dos limites de Belo Horizonte (só mesmo Guarapari, no Espírito Santo), eu fazia coro com aqueles que garantiam que não há nada para fazer na capital mineira – exceto, talvez, fazer as malas e sair daqui. E foi o que fiz. Morei fora do país, voltei, me mudei para São Paulo e viajei bastante, para finalmente perceber, no fim da tarde de um sábado qualquer, que BH é um lugar especial. E que muita gente gostaria de vir para cá, do mesmo jeito que eu fiz questão de conhecer outras terras. Muitos a turismo, mas já conversei com quem sonha em vir para Belo Horizonte de mala, cuia e sem passagem de volta. E a comida é só parte da razão.

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Bares e cerveja em BH

Parque Serra do Curral, BH

Serra do Curral

Naquele sábado, eu voltava de Confins, talvez o mais longínquo dos aeroportos brasileiros, quando passei pela barragem da Lagoa da Pampulha – na época eu morava em São Paulo. O pôr do sol, a Casa do Baile, que é um dos ícones do Niemeyer em BH, e, lá no fundo da Avenida Antônio Carlos, a Serra do Curral abraçando a cidade. Acho que foi ali, provavelmente estimulado por uma boa dose de saudade, que decidi que voltaria a morar em BH.

Dito e feito, e em 2014 eu fiz o caminho de volta. Aluguei um apartamento na Rua Sapucaí, esquina com Avenida Francisco Sales. Esse morro, no bairro Floresta, fica atrás de alguns dos pontos mais importantes de Belo Horizonte. Bastava eu olhar pela janela para dar de cara com a Praça da Estação; bastava eu esticar o pescoço para observar o verde do Parque Municipal transformando o cinza da metrópole.

E, de repente, BH inteira virou parte da minha vida, da mesma forma que fazemos quando viajamos por outras cidades, mas que nem sempre é a realidade quando deixamos a rotina de nossa própria casa nos prender. Dos bares da Sapucaí às cervejarias artesanais, das caminhadas nos parques ao descanso e aos museus na Praça da Liberdade, dos botecos da esquina ao bom e velho Maletta. E, claro, também aumentou a proximidade com minha família, com os jogos do América no Independência (o time não tem ajudado, mas o tropeiro continua incrível) e com o jeito mineiro e belo-horizontino de viver a vida.

Belo Horizonte, MG

Praça da Estação

Até praia eu tinha perto de casa. Bastava descer a escadaria do metrô, levar uma cadeira e garantir meu lugar debaixo do jato d’água que vinha do caminhão pipa. É a Praia da Estação, percussora de um carnaval que hoje arrasta milhões e de uma agenda cultural forte, feita por pessoas que resolveram ocupar a cidade, mesmo que os governantes quisessem desocupá-la. Catuçaí pra lá (para quem não é da terra, é a incrível mistura de Catuaba e Açaí), cerveja pra cá e muita gente tomando sol. Sem mar, mas tudo vigiado pelos olhos atentos do Monumento à Terra Mineira, onde uma inscrição em latim solta aquele que deveria ser o lema da cidade:“Montani Semper Liberti” (Montanheiros estão sempre livres).

Saiba mais: O que fazer Belo Horizonte

Onde ficar em Belo Horizonte: melhores bairros

Se o trem e o metrô, vizinhos de casa, me incomodavam com seus chiados, a vista da mureta da Sapucaí compensava a barulheira. Minha vida era igual a do Rômulo Paes: subir Bahia, descer Floresta, sempre passando pelo Viaduto de Santa Tereza. Caminhar pelos arcos do viaduto era tentador, mas o medo de altura superava a vontade de ressuscitar uma tradição belo-horizontina. Preferi investir o tempo nas visitas frequentes ao Mercado Central, com seu queijos e cheiros, onde eu nunca evito de pedir fígado com jiló e de beber em pé. Quando esse programa fica muito concorrido (ou impraticável), corro para o mexido e para as almôndegas exóticas do Casa Cheia.

Carnaval em BH

Nosso carnaval na Sapucaí

Mas minha forma favorita de botecar em BH é outra. É aquela informal, com cadeiras na calçada, gente nas praças e cara de cidade do interior. Do Paquetá ao Caiçara, do Santa Tereza ao Cruzeiro, eu adoro os bairros e seus bares comunitários, onde o dono é o mesmo há décadas e um mural na parede tem fotos dos cervejeiros mais frequentes. Num desses, no bairro Cruzeiro, bebo perto da foto de meu avô; no outro, no Floresta, a brincadeira era tentar reconhecer os fregueses nas cadeiras pelas fotografias dos murais.

Bairro Mangabeiras visto de cima, Belo Horizonte

Depois de dois anos acordando com a Rua Sapucaí (e com o trem da Central do Brasil), me mudei para a Pampulha, onde vivi a maior parte da vida. Escrevo este texto enquanto ouço buzinas que avisam que tem pão quentinho na porta de casa. Ainda estou pensando se compro quando escuto o carro que oferece jabuticaba no quilo. E o da pamonha, o do bolo de milho e o do queijo canastra ainda não passaram, mas não falharão.

Aqui, o som do trem é substituído pelos cascos dos cavalos; as caminhadas no Parque Municipal foram trocadas pela orla da Lagoa. Os bares, bem, esses continuam em cada esquina, afinal BH é casa deles. E não pense que o jeitão de interior só existe depois que você deixa os limites do Anel Rodoviário. Semana passada, andando pela Praça Raul Soares, no centro da cidade, ouvi um galo cantar. E não foi a primeira vez. Talvez essa seja a característica que mais gosto de BH, que cresceu, virou uma das maiores metrópoles do mundo e a terceira maior do Brasil, mas não perdeu a informalidade, esse jeitão mineiro, de casa de vó. BH é sim um ovo. Um ovo do tamanho do mundo.

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Rafael Sette Câmara

Sou de Belo Horizonte e cursei Comunicação Social na UFMG. Jornalista, trabalhei em alguns dos principais veículos de comunicação do Brasil, como TV Globo e Editora Abril. Sou cofundador do site 360meridianos e aqui escrevo sobre viagem e turismo desde 2011. Pelo 360, organizei o projeto Origens BR, uma expedição por sítios arqueológicos brasileiros e que virou uma série de reportagens, vídeos no YouTube e também no Travel Box Brazil, canal de TV por assinatura. Dentro do projeto Grandes Viajantes, editei obras raras de literatura de viagem, incluindo livros de Machado de Assis, Mário de Andrade e Júlia Lopes de Almeida. Na literatura, você me encontra nas coletâneas "Micros, Uai" e "Micros-Beagá", da Editora Pangeia; "Crônicas da Quarentena", do Clube de Autores; e "Encontros", livro de crônicas do 360meridianos. Em 2023, publiquei meu primeiro romance, a obra "Dos que vão morrer, aos mortos", da Editora Urutau. Além do 360, também sou cofundador do Onde Comer e Beber, focado em gastronomia, e do Movimento BH a Pé, projeto cultural que organiza caminhadas literárias e lúdicas por Belo Horizonte.

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