Eu lembro que minha escrivaninha ficava ao lado da janela – foi por ali que um cheiro de fumaça começou a entrar na casa. Depois, passei a ouvir vozes exaltadas e que me fizeram sair do estado de concentração no qual que me encontrava e dar uma olhada no que acontecia lá fora. Três vizinhas estavam reunidas na rua, dois andares abaixo, olhando para uma janela abaixo da minha. E falando de fogo.
Então, em poucos segundos, eu entendi o que acontecia, gritei por minha amiga com quem dividia apartamento enquanto coloquei na minha pequena mochila meu passaporte, computador, câmera, celular e carteira. Abrimos a porta do corredor, onde outros vizinhos também se movimentavam, descemos as escadas, passando pelo andar do incêndio, e saímos do prédio.
Lá embaixo descobrimos o que tinha acontecido. A senhora que vivia no primeiro andar acendeu uma vela na cozinha, deixou a vela lá e foi até o sétimo andar conversar com uma vizinha. Nesse meio tempo, o vento entrou pela janela, derrubou a vela, cuja a chama acertou um armário de madeira e o resultado foi um fogo tão forte que causou uma espécie de explosão na janela e abalou as estruturas da parede que dividia a cozinha da sala.
Assistimos enquanto três carros do corpo de bombeiros davam conta do serviço. E depois fomos para o café da esquina esperar até que pudéssemos novamente entrar em casa. Eu e a minha mochila com meus bens mais preciosos.
Crédito: The Burning House
Nesse dia me lembrei da outra vez que vivi um incêndio num prédio. Eu era criança, não sei, devia ter uns 4 ou 5 anos. Outra vizinha que deixou a vela acesa na cozinha e esqueceu do vento. Só que nesse prédio morávamos, eu e minha família, no sétimo andar. Não lembro de nada disso direito, tirando que foi uma vizinha que desceu comigo todas aquelas escadas. Acho que minha mãe cuidava da minha irmã mais nova. Lembro de todo mundo aglomerado na rua olhando para cima. Eu não sei dizer ao certo, mas se eu tivesse que apostar, diria que eu tinha meu bem material mais precioso comigo naquela época: minha boneca Barbie.
Voltando à história do início, por vários meses depois do incidente, a senhora e a filha dela passaram a deixar a porta da frente aberta, para ver se o cheiro de queimado passava. E dava para ver a parede enegrecida toda vez que passávamos pelas escadas.
Crédito: The Burning House
Eu proibi minha amiga de acender qualquer vela em casa pelo resto do tempo em que moramos lá (ela não cumpria minha proibição, mas pelo menos passou a acender só aquelas velas pequenas). Mas ficou na minha cabeça até hoje, mais de um ano depois que essa história aconteceu, as coisas que eu corri para salvar. A verdade é que, numa situação semelhante, eram essas as coisas que eu provavelmente faria questão de salvar se tivesse tempo, caso eu, como agora, morasse sozinha.
A verdade é que com essa vida meio nômade, não tenho comigo objetos de estimação ou memórias de família. Nunca tive jóias e as minhas roupas, bem, já contei para vocês sobre meu desapego com elas. Só me resta salvar meus meios de comunicação com as pessoas, meu instrumento de trabalho e meu documento mais querido e importante.
Crédito: The Burning House
E você, o que salvaria (sem contar você mesmo, pessoas e animais de estimação) caso sua casa pegasse fogo?
P.S. As fotos deste post são um de projeto chamado “The Burning House“, é meio antigo, mas esse fotografo teve a ideia muito legal de retratar os objetos salvos pelas pessoas nesse exercício de apego e desapego.
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Pegaria minhas caixas de fotos antigas e a pasta de documentos pessoais (tipo certidões, diplomas e passaportes).
=)