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Coronavírus: o trabalho de um Bombeiro durante grandes crises

Quando temos algum problema, depois de pedir ajuda pra mãe, os Bombeiros são o primeiro socorro que vêm à nossa mente – 193 é o número de telefone dos profissionais que arriscam a própria vida para salvar as nossas. Durante a pandemia de coronavírus não é diferente. Por isso, hoje, vamos conhecer um pouco mais sobre o trabalho deles.

É a história do Soldado Geraldo Corrêa da Rocha Neto, mineiro de Caratinga e lotado no 2o Pelotão de Bombeiros Militar de Ituiutaba. Além de estar trabalhando durante a pandemia de coronavírus, o bombeiro também esteve presente na operação de Brumadinho, buscando as vítimas do maior desastre ambiental do país.

Geraldo vem de uma família de militares. O avô e o tio pela Polícia Militar de Minas Gerais;  o pai é Capitão do Exército Brasileiro. “Sou o primeiro Bombeiro da família e sempre quis seguir a carreira militar pelo exemplo dentro de casa. Minha mãe é professora e minha única irmã é médica em Brasília. Uma família que sempre serviu a sociedade com amor e gratidão”. soldado geraldo bombeiro coronavirus

Ele começou o Curso de Formação de Soldado, em Belo Horizonte, em 2017. “Foi uma das melhores decisões de toda a minha vida”, diz. O curso teve duração de aproximadamente 9 meses. “O aprendizado nesse período é imensurável, e tive a oportunidade de conhecer bombeiros excepcionais, tanto em conhecimento técnico, quanto em visão de humanidade. Verdadeiros exemplos em nossa instituição”.

Após a conclusão do curso, Geraldo foi transferido para Ituiutaba – a  mudança de cidade não foi uma novidade pra ele. “Por meu pai ser militar da Aviação do Exército, nossa família morou em diversas cidades do nosso país: Juiz de Fora – MG, Guaratinguetá-SP, Taubaté-SP, Manaus-AM e Brasília-DF. Tivemos também um período de dois anos morando em Angola, no continente Africano, em uma função diplomática pelo Exército Brasileiro, retornando novamente para Brasília”.

Hoje, o pelotão dele atende a 11 cidades na região do Pontal do Triângulo Mineiro: Ituiutaba, Araporã, Cachoeira Dourada, Canápolis, Capinópolis, Centralina, Gurinhatã, Ipiaçu, Monte Alegre, Prata e Santa Vitória. “Ituiutaba tem sido de grande importância para meu crescimento profissional e pessoal. O 2º Pelotão de Bombeiros se tornou minha segunda casa, motivo de grande satisfação para mim e para todos os militares que aqui trabalham”.

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O curso de mergulho e a oportunidade de oferecer um último adeus a famílias enlutadas

Depois de muitas aulas, muito desgaste físico e mental, Geraldo se especializou em mergulho. “Me sinto honrado de ser instrutor de mergulho do CBMMG, mesmo sendo soldado. A nossa instituição valoriza os militares empenhados no serviço, independente de posto e graduação”.

“Hoje, sei que o aprendizado fará parte de toda a minha carreira, pois a cada ocorrência atendida, a experiência aumenta. Não existem ocorrências iguais, cada uma tem a sua peculiaridade e precisamos estar preparados para tudo e a qualquer momento”.

Ele diz que muitas pessoas já perguntaram por qual motivo os bombeiros se arriscam no mergulho autônomo para resgatar um corpo já sem vida, após um afogamento.

Para ele, a resposta para essa pergunta é complexa.

“A vida é um ciclo. Ela tem início, meio e fim. O fim da vida é marcado pelo sepultamento da vítima, onde amigos e familiares podem ter seu luto. Quando a família não tem a oportunidade de enterrar seu ente querido, é uma ferida que fica aberta e que traz diversas consequências. É por esse motivo que nos arriscamos no mergulho autônomo, para que possamos trazer conforto, consolo, respeito e dignidade para uma família que só quer enterrar seu ente querido. É por esse motivo também que continuamos nossas buscas em Brumadinho, pelos corpos que continuam desaparecidos, para amparar as famílias que tiveram seus entes queridos levados pelo rompimento da barragem”.

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Atuação nas buscas por corpos em Brumadinho

“Fui voluntário para atuar nas buscas em Brumadinho desde o primeiro dia do acidente e tive a oportunidade de trabalhar lá por 7 dias seguidos. O cenário catastrófico em que trabalhamos nos fez refletir sobre várias coisas em nossas vidas e carreiras. Trabalhamos no meio do mar de lama, que poderia nos contaminar por metais pesados decorrentes da exposição aos rejeitos da mineração. Todos sabíamos dos riscos, mas a nossa missão é maior do que isso. Diversas famílias tinham toda a sua esperança depositada na gente, Bombeiros Militares, para encontrar seus entes queridos desaparecidos nessa tragédia”.

Durante os resgates, devido ao risco da contaminação, o período máximo trabalhado é de 7 dias consecutivos até a troca da equipe. “Estive em Brumadinho após o dia das mães, quando houve uma homenagem às vítimas e familiares desse acidente. Ouvimos relatos de mães que estavam com seus filhos desaparecidos, abraçando em prantos os bombeiros, pedindo que encontrassem seus entes queridos”.

Brumadinho foi o maior desastre ambiental do país, o que fez a operação se tornar a maior busca e salvamento do Brasil, tendo o apoio também de vários estados e até de outros países.

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“Nós, Bombeiros, não trabalhamos com base em estatísticas. Não é por determinada ocorrência acontecer poucas vezes que vamos treinar poucas vezes para ela. Pelo contrário, precisamos estar sempre prontos para toda e qualquer ocorrência, pois não sabemos o que nos espera. Brumadinho foi mais um sinal disso”.

Os bombeiros foram os primeiros a chegar no local da tragédia, e conseguiram resgatar várias pessoas ainda com vida – e eles queriam sair só após entregar todos os corpos aos familiares. Porém, depois de mais de um ano de operação, outra ocorrência fez com que as buscas fossem suspensas:  a pandemia do coronavírus.

“Nos mantivemos no local por 422 dias ininterruptos, com efetivo de 3.618 militares, computando, neste período, 270 vítimas. E, com a mesma bravura e empenho, ainda planejamos reaver as 11 joias que continuam desaparecidas”.

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O Corpo de Bombeiros e o coronavírus

O Corpo de Bombeiros de Minas Gerais tem feito treinamentos nos batalhões, para instruir os militares na atuação contra a Covid-19. O último deles, com o objetivo de preparar os órgãos municipais para a desinfecção de ambientes de grandes concentração de pessoas.

O CBMMG também vem auxiliando no processo de construção e montagem do espaço onde estará o Hospital de Campanha de Belo Horizonte. O local, que fica no Centro de Exposições da capital mineira, irá abrigar 768 leitos para pacientes da Covid-19 e pretende ser uma alternativa caso ocorra sobrecarga no sistema de saúde.

Eles são a referência no gerenciamento de ocorrências complexas e vão trabalhar em conjunto com o Governo e a Polícia Militar na estruturação, apoio logístico e prevenção de incêndios e pânico. A expectativa é que a estrutura esteja funcionando até o final deste mês.

“O momento agora é de grande perigo e necessita de cuidados especiais, não só em Minas Gerais, mas em todo o mundo. O vírus que se alastra pelo planeta exige o isolamento social, que é a medida mais efetiva para prevenção. Em nossas folgas, devemos seguir as mesmas restrições que a sociedade em geral: evitar sair de casa; não devemos frequentar aglomerações; evitar contato com o grupo de risco. Porém, a nossa atividade é essencial à sociedade, e por isso seguimos em nossa missão de salvar e proteger a quem precisar”.

Para ele, a preocupação agora é com o coletivo, tanto com a sociedade em geral quanto com os familiares. “Não queremos expor ninguém ao risco por ter contato conosco, muito menos queremos ser contaminados ao ter contato com ocorrências envolvendo o vírus. Por isso, seguimos rigorosamente os protocolos estabelecidos pela nossa corporação, com a utilização correta de Equipamentos de Proteção Individual – EPI’s adequados, higienização e descontaminação das viaturas e dos próprios quartéis”.

Geraldo pede que a população continue em casa, para que quem realmente precisa estar nas ruas possa fazer um bom trabalho. “Não somos super heróis, como alguns pensam. Somos pessoas comuns com o coração disposto a salvar e proteger a quem precisar. Queremos que a sociedade saiba que pode sempre contar conosco, em toda e qualquer situação, todos os dias da semana, 24 horas por dia”.

Algumas ocorrências marcantes na carreira de bombeiro

A gente pediu para o Geraldo contar mais algumas ocorrências que marcaram a vida dele:

  • A cachorrinha afogada

“Fomos chamados para realização de salvamento de um cachorro preso na tubulação de água. Ao chegar no local, encontramos o solicitante, que era um adolescente, e seu irmão, que era uma criança, bastante aflitos pela situação.

A cachorrinha de apenas 40 dias de vida acabou entrando na tubulação de água e não conseguiu sair, ficando presa a aproximadamente sete metros adentro da tubulação, que se encontrava com a tubulação de água também da casa vizinha. Quando conseguimos retirar a cachorrinha, ela já estava sem pulso e sem respirar. Os solicitantes começaram a chorar, sentindo-se culpados por permitir tal situação.

O Sargento Paiva, que era o chefe da nossa guarnição, me pediu para iniciarmos os procedimentos de Ressuscitação Cardiopulmonar (RCP) no animal. Porém, eu não tinha aprendido a fazer o procedimento de RCP em animais, nem mesmo ouvido falar dessa possibilidade, mas começamos mesmo assim.

Utilizando os ciclos para um recém-nascido, fizemos as compressões cardíacas com dois dedos apenas, e para as ventilações, improvisamos com um pedaço de mangueira cortada. Após as compressões e depois da respiração boca a boca com a cachorrinha afogada, o animal voltou a apresentar os sinais vitais, abrindo os olhos para os solicitantes, que choravam de alegria por ter o animal de estimação de volta.

Essa ocorrência me ensinou que muitas vezes é necessário a utilização da criatividade em nossa atividade, e que precisamos estar sempre preparados para toda e qualquer situação, fazendo tudo que está em nosso alcance para salvar e proteger vidas”.

  • Por telefone, bombeiro salva criança engasgada

“Eu estava como rádio operador, das 2h às 4h da madrugada, quando atendi a ligação desesperada de uma mãe chorando por causa de sua filha recém-nascida, de 2 meses, que estava engasgada.

Aquela era uma situação emergencial que necessitava de ações o quanto antes para salvar a vida do bebê e evitar qualquer sequela pela falta de ar. Por telefone, tentei acalmar a mãe e o seu marido, passando as recomendações necessárias para que fosse realizado o procedimento de desengasgo. Após alguns segundos de telefonema, pude ouvir o choro da Maria Cecília, após ser desengasgada, e também o choro de alegria e alívio de seus pais ao telefone.

Poucos dias após o ocorrido, fui visitar a recém-nascida e conhecer sua família.  Família abençoada e com o coração grato aos bombeiros pelo apoio no momento de emergência em que se encontravam.

Essa ocorrência me mostrou que há várias formas de ajudar a salvar vidas, até mesmo por telefone, e o quão importante é conhecer a fundo nossos protocolos de salvamento, pois não sabemos quando e como será necessário utilizá-los.

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Fernanda Pádua

Tenho BH como meu ponto de partida e o meu porto seguro. Entrei pela primeira vez em um estádio de futebol aos 10 anos e ali descobri que queria ser jornalista. 20 anos depois, me tornei repórter esportiva e viajante nas horas vagas. Fiz intercâmbio na Irlanda em 2016/2017, pra estudar inglês. Tenho um objetivo de visitar todos os estados brasileiros e metade dos países do mundo e já percorri boa parte do trajeto, mas várias histórias e paisagens legais ainda estão por vir.

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