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7 coisas que eu sinto falta da Índia

Sempre fui honesto ao escrever sobre a Índia. Não voltei falando só horrores de lá, como fazem muitos, que enxergam a Índia como uma soma das palavras sujeira, barulho e multidão. Enfim, o caos em pessoa, ou melhor, o caos em país. No entanto, também não fiz parte do outro grupo, que volta falando apenas de um lugar zen, pacífico e religioso, uma terra espiritual. A Índia é isso tudo e muito mais – exatamente por isso que merece ser chamada de incrível, como faz a propaganda oficial do governo.

A Índia não é fácil, desperta amor e ódio intensos. Quando você está lá há vários meses, vivendo o dia a dia de uma grande cidade indiana, parece que o ódio ganha do amor. Mas deixe o tempo passar. Fica só o amor e a saudade. Neste post, listo sete coisas que me dão uma tremenda vontade de voltar. Quem sabe em breve?

Transporte ferroviário

A Índia tem o quarto maior sistema ferroviário do mundo, com 65 mil quilômetros. Mais trilhos que a Índia? Só países muito maiores, como Rússia, Estados Unidos e China.

Imagine o seguinte: viajar pelo Brasil, de uma ponta a outra, num meio de transporte barato e mais seguro que o rodoviário. A falta de ferrovias para transporte de passageiros faz uma tremenda falta no Brasil. Já os indianos, por outro lado, usam e abusam dos trens. Todos os anos, 7 bilhões de passageiros são transportados nos trens indianos, o equivalente a toda população da Terra.

É claro que esse sistema, em grande parte herdado dos britânicos, tem muitos problemas. Mesmo assim, não há como negar que funciona. E que dá saudades.

Veja também: Histórias de uma viagem de trem pela Índia

Tracy Hunter, Wikimedia Commons

Religiosidade

É só num país tão diverso quando a Índia que a gente percebe como são poucas as diferenças religiosas do brasileiro. Católico? Evangélico? Judeu? Os outros, no Brasil, são contados nos dedos.

Na Índia não é assim. São milhões de hindus. Milhões de muçulmanos. Milhões de budistas. Milhões de cristãos, de sikhs, de jainistas. Mesmo as minorias religiosas de lá formariam multidões aqui. Tantas religiões geram diferenças impressionantes, como templos e rituais fantásticos. Seja você uma pessoa de fé ou não, não dá para ficar impassível no meio de toda essa religiosidade.

Veja também: Os sikhs, a religião dos turbantes

Varanasi, a cidade mais sagrada da Índia

Templo dos Sikhs

Varanasi, a cidade mais sagrada da Índia

Mundo menos carnívoro

Eu era um carnívoro fervoroso no dia que pisei na Índia. Uma das minhas despedidas do Brasil foi numa famosa churrascaria de Belo Horizonte, onde eu e a Naty nos empaturramos de carnes de todos os tipos.  Três anos depois e cá estamos nós, tentando evitar comer carne no dia a dia. Não viramos vegetarianos, mas a Índia reduziu bastante nosso consumo de carne. E de uma forma simples: foi lá que percebemos que carne não faz tanta falta assim, que muitas vezes abusamos dessa fonte de alimentação por simples costume.

Lá, o normal é ser vegetariano. As crianças são criadas para não comerem nada de origem animal. Indianos passam a vida toda sem colocar um único pedaço de carne na boca – não me esqueço de um amigo indiano que, viajando pela Europa, pediu um cheeseburger no McDonald’s, sem nunca imaginar que um sanduíche de queijo até no nome teria carne.  Na Índia, se um produto tem qualquer coisa de origem animal – até uma pasta de dentes – isso precisa estar avisado na embalagem.

Sinto falta disso. Veja bem, a questão não é dizer que o mundo deveria ser vegetariano. Mas, sinceramente, na Índia eu descobri que comia muita carne, na maioria das vezes sem necessidade.

Veja também: Histórias de viagens de trem na Índia

Rio Ganges, em Varanasi

Tuk-tuk

Um transporte barato, relativamente rápido e que deixa muitas histórias para contar. Durante meus seis meses na Índia, andei de tuk-tuk diariamente. Antes que você me pergunte, estou falando daquele veículo motorizado de três rodas que funciona como um táxi. Ó:

Todos os dias, 300 milhões de indianos andam de tuk-tuk, o que faz desse veículo um dos principais meios de transporte da Índia. Não vou dizer que queria a importação dos tuk-tuks para o Brasil – sei lá, acho que o veículo não é muito seguro – mas tenho que admitir que sinto falta deles. E muita.

Veja também: Compro um tuk-tuk, não pago bem

Preços incríveis

Contei recentemente sobre o hotel que cobrava R$ 1,50 na diária do quarto triplo. Sim, 50 centavos para cada! Mas esse não foi o único preço que deixou saudades. Restaurantes ótimos, bons hotéis e passeios incríveis: tudo era uma pechincha. Tanto que conseguimos gastar em torno de USD 20 por dia durante nossa viagem no país, valor que inclui todos os gastos.

Quando eu voltar, juro que serei menos mão-de-vaca, quer dizer, viajante econômico. Quero ficar em ótimos hotéis, comer em restaurantes incríveis e ter um pouquinho mais de conforto. O bom é que esse luxo cabe no bolso.  E com folga.

Choque cultural

Um soco no estômago. Essa é a melhor definição para o choque cultural que a Índia sempre causa. Dor, água nos olhos e falta de ar são alguns dos sintomas. A consequência? O ódio e a vontade de ir embora de lá correndo e nunca mais voltar.

Sujeira, poluição, barulho, trânsito caótico, comida e até a noção de espaço pessoal – tudo para eles é diferente. Como eu disse acima, na hora isso só dá raiva mesmo, mas as experiências envelhecem bem, né? Hoje sinto falta de tudo aquilo, afinal a Índia pode ser um dos países com mais desafios ao viajante. Só que exatamente por isso poucos países permitem que um turista cresça e mude tanto durante uma viagem. Você nem vai notar, mas voltará uma pessoa diferente.

Veja também: 7 motivos para um choque cultural na Índia

Lugares fantásticos

Uma vila perdida no Himalaia. Um templo às margens do Rio Ganges. Outro, dourado, que atrai milhões de sikhs até a fronteira da Índia com o Paquistão. Neve e deserto, florestas e mar – a Índia tem de tudo e mais um pouco.

Desconheço um país com cenários mais variados. Mas não vou gastar palavras tentando te convencer disso. Deixo as fotos abaixo com essa responsabilidade.

Rishikesh

Manali

Deserto do Thar, na fronteira com o Paquistão

Taj Mahal

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Rafael Sette Câmara

Sou de Belo Horizonte e cursei Comunicação Social na UFMG. Jornalista, trabalhei em alguns dos principais veículos de comunicação do Brasil, como TV Globo e Editora Abril. Sou cofundador do site 360meridianos e aqui escrevo sobre viagem e turismo desde 2011. Pelo 360, organizei o projeto Origens BR, uma expedição por sítios arqueológicos brasileiros e que virou uma série de reportagens, vídeos no YouTube e também no Travel Box Brazil, canal de TV por assinatura. Dentro do projeto Grandes Viajantes, editei obras raras de literatura de viagem, incluindo livros de Machado de Assis, Mário de Andrade e Júlia Lopes de Almeida. Na literatura, você me encontra nas coletâneas "Micros, Uai" e "Micros-Beagá", da Editora Pangeia; "Crônicas da Quarentena", do Clube de Autores; e "Encontros", livro de crônicas do 360meridianos. Em 2023, publiquei meu primeiro romance, a obra "Dos que vão morrer, aos mortos", da Editora Urutau. Além do 360, também sou cofundador do Onde Comer e Beber, focado em gastronomia, e do Movimento BH a Pé, projeto cultural que organiza caminhadas literárias e lúdicas por Belo Horizonte.

Ver Comentários

  • Essa questão de não comer carne e produtos de origem animal na India me intriga. Ouvi dizer que carne de frango e leite são consumidos largamente. Isso é verdade?

    • Oi, Elisa. Sim, é mais fácil achar frango e leite. Muita gente come. Mesmo assim, muitos não comem nem isso - nada de origem animal.

      O problema é que tudo na Índia é contato aos milhões. Se 10% da população comer carne de vaca, por exemplo, então 130 milhões de pessoas fazem isso.

      Sempre é muita gente.

      Abraço.

  • Conheço algumas pessoas que se aventuraram morando na Índia. Por mais que saiba um pouco do lado bom e ruim do país, sempre me impressiono com os relatos. Ainda não me considero preparada pra uma viagem assim, mas esta entre meus objetivos pra daqui a alguns anos. Parabéns pelo excelente post!

    • Oi, Priscila.

      Dá uma olhada em tudo que já escrevemos sobre a Índia. Acho que já são uns 100 posts. E assunto nunca acaba, de tão incrível que aquele país é.

      Abraço.

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Publicado por
Rafael Sette Câmara

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