Intercâmbio no McDonald’s: meu Work and Travel

Todos os dias eu caminhava, às 5h30 da manhã, por um quilômetro inteiro de frio. Alguns escorregões ocasionais com o gelo no caminho eram acompanhados de muitas reclamações e tremores se estivesse chovendo. E todos os dias mesmo, inclusive no 1 de janeiro de 2009, virada da festa de réveillon peruana que eu deixei às 4h30. Como contei para vocês, eu fiz intercâmbio nos Estados Unidos quando estava na faculdade.

O M gigante amarelo era avistado de longe, quase desde a minha casa. Esse era o meu destino, um McDonald’s numa cidade de cerca de 1500 habitantes. Acontece que, apesar dos poucos moradores, a cidade recebe muitos turistas no inverno e no verão, por conta da Loon Mountain, montanha que faz parte da cadeia das White Moutains, além de um rio e um desfiladeiro, o Flume Gorge. E todo mundo, antes ou depois dos passeios, dava uma passadinha no McDonald’s para comer alguma coisa.

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A rotina do work and travel

Eu trabalhava seis dias por semana, entre sete e dez horas por dia. Meu turno era quase sempre de manhã cedo até a hora do almoço – o que era ótimo, porque trabalhar no horário da noite era bem pior: mais frio e ainda tinha que lavar banheiro. Sem contar que o gerente da manhã era muito mais legal e simpático que a do turno da noite.

E como era trabalhar no McDonald’s? Cansativo é a primeira palavra. Eu nunca antes tive que ficar quase o dia todo em pé, indo de um lado para o outro. O Mc tem uma política de que você nunca deve ficar sem fazer nada. Então não adianta bancar o espertão e terminar rápido o trabalho de limpeza para descansar, porque aí o gerente vai mandar você fazer outra coisa, como limpar bandejas ou repor o estoque de molhos e guardanapos.

Vários norte-americanos de perfis bastante diferentes trabalhavam comigo. Tinha o pessoal na faixa entre 20 e 30 anos. Todos eles com pelo menos 2 filhos e odiando trabalhar ali, mas sem planos para mudar de emprego. Tinha o pessoal mais velho, acima dos 50, que trabalhava ali há mais de 10 anos e recebia muito mais que todo mundo pela hora de serviço. E também tinham os jovens de dezesseis anos que estavam ali para juntar uma grana, seja porque eles não ganhavam mais mesada, ou porque estavam juntando dinheiro para a faculdade. Fora isso, havia os chefes, os donos do restaurante e os chefes dos gerentes. E, claro, os quatro brasileiros que estavam lá por causa do intercâmbio.

E até que era divertido – talvez mais nas minhas lembranças que de fato era. Mas o que importa são as memórias, né? Não que eu queira fazer isso novamente na vida. Minha função principal era ficar no caixa e também atender o drive thru. Eu gostava muito do caixa e odiava profundamente o drive thru. Durante a manhã, os mesmos velhinhos iam tomar um café da manhã muito nojento, que incluía burritos, ovos, muito bacon e café descafeinado do Paul Newman – também conhecido como o maior erro do universo (ruim, fedorento e sem cafeína, por que, Senhor?).

Esses clientes frequentes eram uns fofos. E como pediam sempre a mesma coisa, enquanto eles estavam estacionando o carro a gente já deixava a comida preparada. Em compensação, o drive thru era um inferno porque toda vez que a janelinha abria vinha um frio do capeta e eu não podia gritar: CAPETAAA!, porque tinha que sorrir pro cliente e colocar minha mão para fora para pegar o dinheiro e depois correr para dentro, buscar a comida, correr para outra janela, abrir (pensar CAPEEETA!) e entregar a comida e dizer: Volte sempre!

Nos intervalos eu limpava o lobby, limpava bandejas, repunha o estoque e comia. Eu tomava sorvete ou milkshake todos os dias, na hora do almoço. Porque sorvetes e bebidas eram grátis para os funcionários (e também a máquina de café chique e nova que demorou uns dois anos para chegar no Brasil). A comida mesmo, teoricamente, não era de graça, mas isso só valia quando os chefões-donos estavam lá. Os gerentes não ligavam de nos dar o almoço em vez de cobrar metade do valor, como determinavam as regras. Engordar, eu engordei, mas só 5kg, o que naquela época não era muita coisa, já que eu passei de 48kg para 53kg (bons tempos).

E você não enjoou da comida e nunca mais quis comer ali, porque viu ela sendo feita? Bom, não. Eu não trabalhava na cozinha, até tive algumas experiências mas sou muito-mega-desastrada e derrubei todo o pote de catchup no chão e nunca mais voltei lá (a foto acima é obviamente fake). Mas eu via como era feito e, apesar do McDonald’s não estar me pagando nada por isso, garanto que eles realmente seguiam padrões de limpeza e qualidade – pelo menos no restaurante onde eu trabalhava. Eu não quis comer hambúrguer por um tempo depois que voltei para o Brasil, mas passou rápido. Desde então, quando vou a um McDonald’s, dou uma avaliada no serviço e me lembro dos tempos em que eu merecia o quadrinho de funcionária do mês.

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Luiza Antunes

Luiza Antunes é jornalista e escritora de viagens. É autora de mais de 800 artigos e reportagens sobre Viagem e Turismo. Estudou sobre Turismo Sustentável num Mestrado em Inovação Social em Portugal Atualmente mora na Inglaterra, quando não está viajando. Já teve casa nos Estados Unidos, Índia, Portugal e Alemanha, e já visitou mais de 50 países pelo mundo afora. Siga minhas viagens em @afluiza no Instagram.

Ver Comentários

  • Poxa parabéns pela trajetória!
    Intercâmbio é sempre válido e toda experiência de trabalho também!

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Luiza Antunes
Tags: Intercâmbio

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