As torres funerárias de Sillustani, em Puno, no Peru

Não era um velório qualquer. Só os ricos e importantes do Reino de Colla eram enterrados em Sillustani. Com até 12 metros de altura e em formato esférico, as torres funcionavam como mausoléus. Famílias inteiras eram enterradas ali, com os corpos sempre em posição fetal e muitas vezes acompanhados de objetos preciosos, que poderiam ser úteis no outro mundo. Uma rampa era construída no pé de cada torre – também chamadas de chullpas – e os mortos entravam no mausoléu por cima.

As torres eram feitas de pedras sobrepostas, sem argamassa, e, tinham apenas uma pequena abertura, voltada para o leste. Isso era representativo. É que assim os mortos tinham um contato direto com o deus sol, que renasce das sombras a cada dia. Após a torre funerária ser selada, o mausoléu, localizado a 3900 metros de altitude, se transformava no lugar ideal para mumificar corpos, que permaneciam relativamente preservados ao longo dos séculos.

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Sillustani, Peru

Torre com rampa, para simular como era na época dos colla

Os colla dominaram uma parte dos Andes por quatro séculos, entre 1100 e 1450 d.C. Eles não foram os primeiros a habitar e a enterrar seus mortos ali – os pukara chegaram 800 anos antes de Cristo e permaneceram por quase 13 séculos. Mas foram as torres funerárias criadas pelos colla que sobreviveram. E, mais tarde, as erguidas pelos incas, que anexaram o Reino de Colla ao seu império no século 15. São essas ruínas que hoje formam um dos lugares mais interessantes de Puno, no Peru: o Complexo Arqueológico de Sillustani.

Casas com telhados de palha e arcos de entrada – todos com o simpático Torito de Pucará no topo – deixavam claro que tínhamos entrado numa parte especial da cidade de Puno, o distrito de Atuncolla. Com apenas 5 mil habitantes e a 34 quilômetros do centro, essa é uma área rural de Puno, onde quase 90% da população vive do campo, em pequenos povoados e casinhas isoladas. Mas não foi sempre assim. Atuncolla já foi capital do Reino Colla. Hoje, restam as torres funerárias de Sillustani como memória da grandiosidade desse povo pré-inca.

Puno, Peru

Casas do distrito de Atuncolla – detalhe para o Torito de Pucará, no topo do arco de entrada

Nossa van parou no estacionamento do Complexo Arqueológico. Passamos por uma rua cheia de barraquinhas de artesanato, uma igrejinha simpática e um povoado que fica às margens de um lago. Nosso destino era montanha acima, uma caminhada relativamente simples, mas que fica mais difícil por conta da altitude de quase quatro mil metros. Subimos o morro devagar, mas não demorou para encontrarmos a primeira torre funerária.

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Sillustani, Peru

Sillustani, Peru

“Muitas delas foram danificadas por saqueadores de tumbas, que buscavam os objetos preciosos enterrados ali”, explicou nosso guia.  Os raios completaram os estragos, destruindo muitas das torres. Hoje, para evitar o problema, a região conta com vários para-raios.

chullpas, no Peru

Algumas das estruturas foram reconstruídas, para deixar claro como eram as tumbas. Outras permanecem pela metade. As múmias e os objetos encontrados, quando não foram levados por saqueadores, passaram a ocupar salas de museus mundo afora.

Sillustani, Peru

O encaixe das pedras era perfeito e é fácil perceber quais foram as construções refeitas, por conta da argamassa. Além das torres, o destaque é a paisagem, principalmente quando chegamos ao topo do morro e percebemos a grandiosidade do Lago Umayo, que tem uma ilha enorme no meio. Localizado a cerca de 20 quilômetros do Titicaca, o Umayo vive na sombra do maior e mais alto lago navegável do mundo. Mas o cenário não perde em nada para o do vizinho famoso.

Sillustani, Peru

Deixamos Sillustani e seguimos para o centro de Puno, de onde saímos para outro passeio tradicional da cidade, que visita as Ilhas Flutuantes de Uros, também habitadas há séculos, e a Ilha de Taquile, que até hoje guarda traços fortes de uma cultura secular. Se passar por Puno, faça esses passeios pelas ilhas, mas também não deixe de dar as costas para o Titicaca, pegar a estrada e conhecer as Torres Funerárias de Sillustani. Os Colla não escolheram enterrar seus mortos ali por acaso.

 Lago Umayo, Puno, Peru

Lago Umayo

Várias agências de Puno oferecem o passeio, que dura metade de um dia e custa entre 30 e 40 soles. Também dá para ir por conta própria, pegando os ônibus que ligam Puno a Juliaca e parando no meio do caminho, mas o transporte público da estrada para Juliaca até o Complexo Arqueológico não é dos melhores.  Outra alternativa é combinar com um taxista, incluindo um tempo de espera de 1h30, para que você possa conhecer as tumbas (e subir o morro) com calma.

*O 360meridianos viajou ao Peru a convite do Submarino Viagens e da PromPerú.

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Rafael Sette Câmara

Sou de Belo Horizonte e cursei Comunicação Social na UFMG. Jornalista, trabalhei em alguns dos principais veículos de comunicação do Brasil, como TV Globo e Editora Abril. Sou cofundador do site 360meridianos e aqui escrevo sobre viagem e turismo desde 2011. Pelo 360, organizei o projeto Origens BR, uma expedição por sítios arqueológicos brasileiros e que virou uma série de reportagens, vídeos no YouTube e também no Travel Box Brazil, canal de TV por assinatura. Dentro do projeto Grandes Viajantes, editei obras raras de literatura de viagem, incluindo livros de Machado de Assis, Mário de Andrade e Júlia Lopes de Almeida. Na literatura, você me encontra nas coletâneas "Micros, Uai" e "Micros-Beagá", da Editora Pangeia; "Crônicas da Quarentena", do Clube de Autores; e "Encontros", livro de crônicas do 360meridianos. Em 2023, publiquei meu primeiro romance, a obra "Dos que vão morrer, aos mortos", da Editora Urutau. Além do 360, também sou cofundador do Onde Comer e Beber, focado em gastronomia, e do Movimento BH a Pé, projeto cultural que organiza caminhadas literárias e lúdicas por Belo Horizonte.

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