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Hilda Furacão: passeio em Belo Horizonte sobre história de Roberto Drummond

O nome dela era Hilda Gualtieri Von Echveger, mas Belo Horizonte inteira – e o Brasil – aprenderam a chamá-la de Hilda Furacão.

A moça da alta sociedade mineira que largou o noivo milionário no altar e se mudou para a maior zona de prostituição do Brasil é um ícone pop de Belo Horizonte há décadas. Hilda voltou aos holofotes no final de 2023, depois que trechos da minissérie da Globo viralizaram no TikTok.

Escrito por Roberto Drummomd, o livro Hilda Furacão foi lançado em 1991. Sete anos mais tarde veio a adaptação para a TV, que teve Ana Paulo Arósio no papel de Hilda, Rodrigo Santoro como Frei Malthus, Thiago Lacerda como Aramel e Danton Mello representando Roberto Drummond.

O elenco, que é um dos pontos fortes da produção global, contou ainda com Matheus Nachtergaele
(Cintura Fina), Paulo Autran (Padre Nelson), Stênio Garcia (Tônico Mendes/Antônio Luciano), Eva Todor (Loló Ventura) e Maria Tomba-Homem (Rosi Campos), entre outros nomes.

Hilda Furacão: do livro ao TikTok

Livro mais vendido de Roberto Drummond, a história narrada em Hilda Furacão se divide entre duas cidades: a maior parte da trama ocorre em Belo Horizonte. O restante acontece em Santana dos Ferros, terra de origem do narrador e de dois de seus amigos, Malthus, religioso que busca ser declarado santo em vida, e Aramel, que sonha em ser astro em Hollywood.

A história se passa entre 1º de abril de 1959, época em que o Brasil era comandado por Juscelino Kubitschek, e 1º de abril de 1964, quando ocorre o golpe militar. No primeiro parágrafo do livro, Roberto Drummond já ambienta sua narrativa:

“Na época dos acontecimentos que tanto deram o que falar envolvendo Hilda Furacão, eu trabalhava como repórter na Folha de Minas numa Belo Horizonte que cheirava a jasmim e ao gás lacrimogêneo que a polícia jogava nos estudantes e que acabava sendo o perfume daqueles dias. Eu era um rapaz magro, fumava se-medão, sofria de três ou quatro doenças imaginárias, estava fichado no Dops e acreditava que ainda ia ter minha Sierra Maestra”.

No começo do livro, Hilda ainda é uma garota do bairro de Lourdes, reduto das classes A e B de Belo Horizonte. Ela frequenta os bailes do Minas Tênis Clube, chamados de forma jocosa de missas dançantes pois ocorriam todo domingo, às 10h.

Hilda Furacão na minissérie da Globo

Não faltavam interessados em Hilda, que logo ficou noiva de um banqueiro milionário de São Paulo. Para a surpresa da cidade, no dia do casamento a mulher largou o noivo no altar e foi morar na Rua Guaicurus, no centro de BH e hoje a maior zona de prostuição do Brasi: quase cinco mil profissionais do sexo trabalham no local.

A entrada de Hilda na Zona Boêmia gera uma grande reação da tradicional família mineira, representada pela Liga de Defesa da Moral e dos Bons Costumes. A presidente da liga, Dona Loló Ventura, chama o jovem Frei Malthus para exorcizar Hilda Furacão, expulsar a Zona Boêmia do centro de Belo Horizonte e assim realizar seu primeiro milagre.

Não é difícil imaginar o que acontece. No dia marcado para o exorcismo público, Frei Malthus se apaixona por Hilda Furacão. Começa então a novela: Hilda Furacão ficará com o padre? Ele largará a batina? Ela deixará a zona boêmia?

Livro e série são, portanto, uma história de amor, mas não só. Narrado por um comunista e citando dezenas de políticos que marcaram a história do Brasil, Hilda Furacão é um livro político. Conta como a inocência e a esperança dos anos 1950 desaguaram na ditadura militar.

Hilda Furacão existiu?

Como muita gente está descobrindo agora, Hilda Furacão é cheia de mistérios. Começando pelo mais importante: ela existiu mesmo?

O livro Hilda Furacão é narrado em primeira pessoa por um personagem também chamado Roberto Drummond, um jovem jornalista que divide seu tempo entre o trabalho na Folha de Minas, reuniões clandestinas do partido comunista, filmes nos cinemas de rua de Belo Horizonte e cervejadas nos bares da cidade, entre eles o hoje mítico (e ainda de portas abertas) Café Palhares. Ou seja, narrador e autor se confundem.

Essa confusão é proposital e contribui para a dúvida que torna Hilda tão especial – o que é verdade e o que é ficcção? Há personagens tão extraordinários que parecem totalmente inventados, mas não são. Cintura Fina e Maria Tomba Homem realmente existiram; os vereadores Orlando Bonfim e Padre Cyr também, assim como o vilão da trama, um magnata e político chamado Antônio Luciano.

Ao contrário do autor, que venceu o medo e bancou o nome, a Globo optou por mudar o nome desse personagem para Tonico Mendes.

Para completar o labirinto, vários jornais do Brasil noticiaram que Hilda Furacão morreu na Argentina, em 2014. No livro, Roberto Drummond termina sua histrória com Hilda morando em Buenos Aires, na década de 1960.

Apesar das muitas semelhanças com a realidade, vale lembrar o óbvio: Hilda Furacão é uma obra ficcional.

Em qual cidade foi gravada a novela Hilda Furacão?

Várias cenas externas foram gravadas em Belo Horizonte. Parque Municipal, Igreja de São José, Praça da Liberdade e Praça da Estação são alguns dos lugares da capital mineira que aparecem na produção global.

Tiradentes representou a cidade de Santana dos Ferros, enquanto muitas outras cenas foram gravadas nos estúdios da Globo no Rio de Janeiro. Na série, a rua Guaicurus é toda cenográfica.

Quer conhecer a BH de Hilda Furacão?

Poucos livros impactaram tanto em minha vida como Hilda Furacão. É por isso que criei, no começo de 2023, um passeio literário que mergulha da Belo Horizonte da Hilda e que já foi tema de reportagens da Folha de São Paulo e da TV Globo.

É uma caminhada de 4,5 km por Belo Horizonte. Com quatro horas de duração, o tour começa na estátua do Roberto Drummond, na Savassi, bairro onde o autor passou a maior parte da vida. De lá, seguimos para a Rua da Bahia, passamos pelo Minas Tênis Clube, Praça da Liberdade, Edifício Maletta e entramos no prédio da antiga Câmara dos Vereadores de BH.

Depois, seguimos pela Avenida Afonso Pena, passamos pelo Hotel Financial, descobrimos um cinema de rua desativado, entramos na Rua Guaicurus e terminamos com um chope no Café Palhares.

O passeio custa R$ 90 (com chope, bolinho de kaol e também pausa para café). Você vai ver cenas selecionadas da série da Globo, leremos vários trechos do livro e vamos comparar lugares que aparecem na TV e são citados no livro com os mesmos endereços atualmente. Reserve seu passeio pelo Instagram Caminhadas BH, do Movimento BH a pé, ou por WhatsApp.

Quando o passeio acaba, criamos um tribunal entre os participantes e tentamos responder as perguntas que Roberto Drummond deixou: Por que Hilda Furacão foi para a Zona Boêmia? Hilda Furacão realmente existiu?

Spoiler: nunca tivemos consenso. Mais uma prova da genialidade do livro de Roberto Drummond.

Caminhada de Hilda Furacão em Belo Horizonte

Quem foi Roberto Drummond?

Jornalista e escritor, Roberto Drummond nasceu em Ferros, a 180 quilômetros de Belo Horizonte. Ele se mudou para a capital mineira ainda na adolescência, época em que morava na Rua da Bahia.

Começou a trabalhar na Folha de Minas, jornal que funcionava na esquina das ruas Curitiba e Carijós. Como jornalista, Roberto ganhou um Prêmio Esso. Como escritor, foi o autor revelação do 17º Prêmio Jabuti. Hilda foi o romance mais importante de uma carreira literária que também inclui A morte de D.j. em Paris (1971), Inês é morta (1993) e Ontem à noite era sexta-feira (1988), entre outros títulos.

Muitas das histórias de Roberto Drummond são ambientadas em Belo Horizonte, cidade que ele amava e onde decidiu morar, contrariando uma tendência de sua geração – nessa época BH exportava escritores em massa para o Rio de Janeiro.

Jornalista esportivo e apaixonado por futebol, Roberto Drummond morreu em 2002, aos 68 anos. Ele foi internado com problemas cardíacos pouco antes de Brasil X Inglaterra, talvez o jogo mais importante daquele torneio.

Sua última crônica no Estado de Minas teve o título “Seja o que Deus quiser”.

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Rafael Sette Câmara

Sou de Belo Horizonte e cursei Comunicação Social na UFMG. Jornalista, trabalhei em alguns dos principais veículos de comunicação do Brasil, como TV Globo e Editora Abril. Sou cofundador do site 360meridianos e aqui escrevo sobre viagem e turismo desde 2011. Pelo 360, organizei o projeto Origens BR, uma expedição por sítios arqueológicos brasileiros e que virou uma série de reportagens, vídeos no YouTube e também no Travel Box Brazil, canal de TV por assinatura. Dentro do projeto Grandes Viajantes, editei obras raras de literatura de viagem, incluindo livros de Machado de Assis, Mário de Andrade e Júlia Lopes de Almeida. Na literatura, você me encontra nas coletâneas "Micros, Uai" e "Micros-Beagá", da Editora Pangeia; "Crônicas da Quarentena", do Clube de Autores; e "Encontros", livro de crônicas do 360meridianos. Em 2023, publiquei meu primeiro romance, a obra "Dos que vão morrer, aos mortos", da Editora Urutau. Além do 360, também sou cofundador do Onde Comer e Beber, focado em gastronomia, e do Movimento BH a Pé, projeto cultural que organiza caminhadas literárias e lúdicas por Belo Horizonte.

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