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Povo Qashqai: como vivem os últimos nômades do Irã?

Percorrendo as montanhas da cordilheira de Zagros há cerca de mil anos, os últimos membros do povo Qashqai lutam para manter suas tradições diante da modernização do país e da ausência de incentivos.

Nessa reportagem, você verá como os últimos nômades do Irã vivem e quais são os desafios que eles enfrentam atualmente. Além disso, também vamos te mostrar como você pode ter uma vivência de turismo de base comunitária com eles, caso vá visitar o país!

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Como vivem os nômades Qashqai, no Irã?

“Para nós, isso é a liberdade”. De dentro do jeep antigo, Bahman, o guia, apontou para a cordilheira de Zagros, que recortava o horizonte como uma pintura cor de areia. “Viver em um apartamento na cidade é como estar em uma prisão”. 

Localizada no noroeste do Irã, os Zagros formam a maior cadeia de montanhas do país. Desde o século 11, a região é a casa do povo Qashqai, ao qual Bahman pertence, um povo nômade de origem turca que encontrou seu caminho até os arredores de Shiraz descendo pela fronteira com o Iraque.  

Há apenas um século, um quarto da população do Irã era nômade. Hoje, esse número caiu para cerca de 1 milhão, ou 1,68% da população total. 400 mil deles pertencem à tribo Qashqai, o que faz dela a segunda maior tribo nômade do país, depois dos Bakhtiari. Apesar da drástica redução das últimas décadas, o Irã ainda concentra a maior população nômade do mundo, ao lado de países da Ásia Central, como a Mongólia e o Quirguistão. “Não há muito esforço ou interesse na manutenção do estilo de vida desses povos, e as dificuldades são muitas”, comenta Bahman. 

Nomade Qashqai Irã - Como vivem e como visitar um acampamento
Bahman, guia da minha experiência em um acampamento nômade

De acordo com essa reportagem da BBC, o governo já empreendeu diversas tentativas de fazer os Qashqais assimilarem a cultura dominante no país. Mas, apesar disso, eles resistem. Orgulhosos de seu passado, eles continuam seguindo os passos de seus ancestrais, ano após ano: no inverno, recolhem seus rebanhos e percorrem 400 quilômetros da cordilheira até o Golfo Pérsico, onde passam os meses mais frios. No verão, quando o calor próximo à costa é escaldante, eles fazem o caminho inverso em busca do ar fresco das montanhas. 

Encontramos o primeiro grupo por volta das 11 da manhã, depois de enfrentar algumas horas de estrada a partir de Shiraz. Estávamos na metade de outubro e o clã já havia percorrido metade do trajeto montanha abaixo.

Em geral, eles viajam em grupos formados por uma ou mais famílias. Por ali, encontramos duas mulheres idosas, uma garota de cerca de vinte anos, três homens e duas crianças que nos receberam como um dos convidados de Bahman, com uma xícara quentinha de chá preto: apesar da vida simples e repleta de restrição, os Qashqais são considerados alegres e hospitaleiros. 

Familia nomade no Irã
Membros da família se reúnem após o almoço para fumar shisa

Autossuficientes, seus dias são preenchidos pelas tarefas cotidianas que tornam possível seu estilo de vida: cuidar dos animais, preparar a comida, fazer manutenção nas barracas e utensílios do dia a dia, levantar acampamento, migrar.

A maior parte da renda vem dos rebanhos de cabra e ovelha. Com eles, os nômades conseguem leite, carne e queijo para venda e consumo próprio, lã para tecer mantos e tapetes que cobrem o teto das barracas ou são comercializados nos bazares das cidades, e eles podem, ainda, vender alguns dos filhotes nos mercados. A água que bebem é coletada dos rios e nascentes e a pouca energia elétrica que precisam vem de pequenos painéis solares. 

“Estão falando sobre o urso”, disse Bahman, quando nos sentamos dentro de uma das tendas para almoçar. A comida servida era arroz com vegetais e pão, acompanhado de chá. Depois de comer, uma pausa no trabalho para fumar shisha e beber mais chá.

“Em geral, esse é o momento em que eles discutem questões do dia a dia. Essa manhã encontraram mais pegadas de um urso pardo que tem atacado os rebanhos aqui da região”, completou ele. Entre eles, se comunicam em um dialeto turco, mas a maior parte também fala farsi, a língua oficial do Irã. Bahman tentava traduzir pra gente um pouco do que diziam.  

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Os desafios enfrentados pelos Qashqai para manter a cultura viva

Com inglês fluente e formação em Gestão de Turismo, Bahman é um exemplo do que vem ocorrendo com muitos Qashqais jovens cujos pais têm alguma condição financeira. Nascido livre nas montanhas  de Zagros, se mudou para Shiraz para estudar e por ali ficou.

Esse movimento é um risco à cultura Qashqai, uma vez que os pais contam com os filhos para ajudar nos trabalhos do campo. Romper essa corrente compromete a continuidade das tradições. Um problema de difícil resolução, uma vez que as melhores oportunidades de trabalho permanecem nas cidades. 

Mulher Qashqai fumando shisa na cordilheira de Zagros, no Irã
Tia de Bahman fumando shisha

Mas, ao contrário de outros ex-nômades que acabam preferindo a vida sedentária, no entanto, ele se dedica a levar viajantes estrangeiros para conhecer de perto o estilo de vida de seus ancestrais e, assim, difundir e ajudar sua cultura. 

Embora grande parte dos nômades mais velhos seja semi-anafalbeta, há uma escola itinerante que acompanha a rota migratória para atender as crianças Qashqai. Aos 10 anos, Fátima, prima de Bahman que conhecemos no acampamento seguinte, é uma dessas crianças e fez questão de mostrar seus livros escolares, respondendo às minhas perguntas com um inglês desenvolto.

Entre as apostilas que tirou da mochila, estavam língua estrangeira, matemática, tecnologia, ciências e ensino religioso. Assim como a maior parte da população iraniana, os Qashqai são xiitas, mas expressam a religião com retoques específicos da própria cultura. 

Enquanto isso, uma tia de Bahman colocava preparava mais uma rodada de chá, dessa vez de tomilho. Seja nas montanhas ou nas cidades, entre nômades ou persas, é sempre hora para um chá no Irã. “Mas, por aqui, costumamos beber diferente”, disse Bahman.

“Despejamos um pouco do chá no pires e bebemos direto dali. Assim ele esfria mais rápido e terminamos logo de beber. Não temos muito tempo para perder. Há muito o que fazer nas montanhas”.

Os últimos nômades do Irã

Como visitar um acampamento Qashqai de forma ética durante sua viagem pelo Irã

A melhor forma de visitar um acampamento nômade é através do turismo de base comunitária. Isso significa que você deve se certificar de que os passeios são feitos com o envolvimento da comunidade, que eles são os beneficiados desse tipo de iniciativa e estão confortáveis com a sua presença.

Ainda é preciso alertar que algumas agências de Shiraz oferecem a experiência com pessoas que não vivem mais, de fato, como nômades. São famílias que podem ser descendentes dos Qashqai, mas já se assentaram e somente fazem uma “encenação” do que seria o estilo de vida nômade.

Além disso, tenha em mente de que, devido aos fluxos migratórios, só é possível fazer a vivência com os nômades no outono ou na primavera, abril a junho e de setembro a novembro, quando eles estão descendo ou subindo a montanha.

Se você quer uma experiência ainda mais rica, investigue se há algum festival ou evento cultural acontecendo durante o período da sua visita. Isso pode oferecer uma visão ainda mais profunda da cultura Qashqai.

Para garantir um passeio autêntico e ético, recomendamos que você feche suas experiências no Irã com a 1stQuest, uma agência especializada no país que tem tudo o que você precisa para a viagem e me auxiliou muito na minha passagem pelo país. Você pode contratar o passeio por aqui.

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Natália Becattini

Sou jornalista, escritora e nômade. Viajo o mundo contando histórias e provando cervejas locais desde 2010. Além do 360meridianos, também falo de viagens na newsletter Migraciones, no Youtube e em inglês no Yes, Summer!. Vem trocar uma ideia comigo no Instagram. Você encontra tudo isso e mais um pouco no meu Site Oficial.

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