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Atlas: Brasil, Portugal

Maria Amália Vaz de Carvalho, escritora da vida entre Brasil e Portugal

Quase 100 anos após sua morte, Maria Amália Vaz de Carvalho virou nome. Como em geral acontece com personalidades importantes, essa escritora, jornalista, ativista e poetisa portuguesa não demorou a batizar uma rua de sua cidade natal, Lisboa.

Décadas mais tarde vieram outras homenagens: hoje ela nomeia também uma escola secundária da cidade, além de um concurso literário. Tanta reverência é mais que merecida, afinal Maria Amália Vaz de Carvalho publicou dezenas de livros e foi cronista de jornais e revistas não só em Portugal, mas mesmo do lado de cá do Atlântico. Ela escreveu para Renascença, A Mulher, A semana de Lisboa, O Ocidente e até para o carioca Jornal do Comércio.

Outro periódico do Brasil que publicou a autora portuguesa foi A Mensageira, veículo do final do século 19 que se definia como uma “revista literária dedicada à mulher brasileira”. Nela, Maria Amália defendeu o direito das mulheres à educação, criticando a criação feminina “exclusiva para o casamento”, algo que imperava na sociedade oitocentista.

Por tudo isso, a escritora deixou uma obra como poucas em Portugal. E foi também bastante popular no Brasil. Ao longo de uma carreira de cinco décadas, ela fez de tudo um pouco, assinando ora com o próprio nome, ora com seu pseudônimo, Valentina de Lucena. Pelo menos 25% de seus livros foram críticas literárias, muitas delas compiladas em obras como Serões no Campo (1877) e Arabescos (1880).

maria amalia vaz de carvalho

Mas a autora também teve tempo de produzir ensaios, memórias, poesias, biografias, cartas, romances e contos. Muito, ainda mais para uma época em que oito em cada dez mulheres portuguesas eram analfabetas. Além da criatividade para contar histórias, foi no ativismo que a portuguesa se destacou. “A mulher é um poder, é preciso aproveitá-la na obra comum da civilização”, escreveu Maria Amália, em frase conhecida e citada pela escola que hoje leva seu nome.

Num período em que mesmo mulheres de famílias ricas e poderosas não tinham acesso à educação, Maria Amália lutou pela criação de liceus — escolas — femininas. A própria Maria Amália teve que lidar com a falta de uma educação formal, já que a autora nunca frequentou uma escola, mas foi educada e alfabetizada pela mãe.

Olhando do século 21, não falta quem lembre que a escritora era, em vários aspectos, conservadora, até mesmo pela própria formação familiar. Ela era filha de um deputado e sobrinha de um visconde, além de ser descendente de Dom José Vaz de Carvalho, figura importante na corte de Dom João V (1689 – 1750).

Até mesmo por isso, a escritora sempre valorizou a religião e a família tradicional, destacando o papel da esposa dentro do núcleo doméstico. Ela escreveu, por exemplo, que “o casamento de duas almas que se enlaçam para a vida é indissolúvel e sagrado.” Mas isso não a impediu de afirmar: “educar a mulher, eis o grande problema que resta ainda a resolver”.

Dentre seus ensaios, muitos hoje são vistos como tradicionalistas, como Cartas a uma Noiva (1891). Outra crítica que lhe é feita é a de não dar destaque a problemas sociais e ao conflito de classes — nesse sentido, Maria Amália foi vista como escritora aristocrata.

Voltando às suas obras literárias, no gênero de histórias curtas se destacam Contos e Fantasias, de 1880 e de onde saíram as três narrativas que formam o livro lançado em dezembro de 2020 pelo Grandes Viajantes, nosso clube de literatura; e Contos Para os Nossos Filhos, uma coletânea de 1886 que ela organizou junto com o marido, o poeta brasileiro Antônio Cândido Gonçalves Crespo. Por muitos anos, Contos Para os Nossos Filhos fez parte da lista de livros indicados por escolas portuguesas.

A relação com o marido pode ser sentida nas obras da autora, inclusive nos três contos que integram a coletânea O Melhor Sono do Milionário, do Grandes Viajantes. Filho de pai português e mãe negra, Gonçalves Crespo nasceu no Rio de Janeiro, onde morou até os quatorze anos. Voltou para Portugal para estudar em Coimbra, mas sempre manteve relações com o Brasil. Ainda era um estudante quando se casou com Maria Amália e foi ela quem introduziu o marido no círculo intelectual e artístico do país.

maria amalia vaz de carvalho

Todos os contos que integram a nova coletânea têm entre seus personagens portugueses ou descendentes de portugueses que travam relações com o Brasil, narrando viagens entre os dois países. É possível traçar um paralelo com a própria vida familiar da escritora e sua família luso-brasileira.

Alguns dos companheiros dos seus passeios e folguedos da mocidade tinham morrido, outros tinham deixado o Brasil e viviam na Europa, em Portugal.
— Como puderam eles deixar isto sem saudade? É verdade que eu gostava de morrer lá, onde nasci, na minha pobre aldeia, ao pé da minha mãe.

O Melhor sono do milionário, de Maria Amália Vaz de Carvalho

Foi na casa de Maria Amália e Antônio Cândido que surgiu um dos primeiros salões literários de Lisboa. Quer dizer: muito mais na casa dela, porque Antônio morreu cedo, aos 37 anos. Pela residência de Maria Amália passaram autores como Eça de Queiroz, Ramalho Ortigão e Guerra Junqueiro — sim, boa parte da geração de 1870, também conhecida como Geração de Coimbra, que reinventou a literatura portuguesa e introduziu o realismo. Muitas das obras da autora nascem nesse período, os últimos anos no século 19.

livro melhor sono do milionário

Capa de O Melhor Sono do Milionário, em ilustração de Evandro Bertol

Maria Amália Vaz de Carvalho, primeira mulher na Academia das Ciências de Lisboa

É difícil definir qual foi o ponto mais alto na carreira da escritora, mas um deles talvez tenha sido o dia 13 de junho de 1912. Foi nessa data que Maria Amália foi eleita para fazer parte da Academia das Ciências de Lisboa, junto com Carolina Michaëlis. A eleição das duas foi um marco para uma instituição que na época tinha 133 anos e até então nunca tinha aceitado mulheres. Apenas como comparação, a Academia Brasileira de Letras só elegeu uma mulher em 1977, quando a cearense Rachel de Queiroz foi escolhida.

Não faltam estudos que comparem as obras de Maria Amália com o de outras duas escritoras do mesmo período, as brasileiras Nísia Floresta e Júlia Lopes de Almeida. Em comum, as três abordaram assuntos parecidos, foram pioneiras na luta pela educação feminina e lidas e respeitadas em vida, mas acabaram sofrendo uma espécie de memoricídio com o passar das décadas.

Se Maria Amália ainda é publicada em Portugal, no Brasil a autora passou por um esquecimento maior, embora algumas de suas obras ainda possam ser encontradas em sebos e bibliotecas públicas. Agora, as três escritoras já tiveram obras resgatadas pelo Grandes Viajantes.

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Rafael

Siga minhas viagens também no perfil @rafael7camara no Instagram - Quando criança, eu queria ser jornalista. Alcancei o objetivo, mas uma viagem de volta ao mundo me transformou em blogueiro. Já morei na Índia, na Argentina e em São Paulo. Em 2014, voltei para Belo Horizonte, onde estou perto da minha família, do meu cachorro e dos jogos do América. E a uma passagem de avião de qualquer aventura.

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2 comentários sobre o texto “Maria Amália Vaz de Carvalho, escritora da vida entre Brasil e Portugal

  1. Riquisimo; super refrescante, siempre los he preparado con vino, las manzanas verdes las naranjas cortadas en cuadritos bien helada un balsamo. Pero ahora no voy a poder hacerlo mi estado de salud me ha traido trastornos de gastritir y me tienen muy cortito con todo nada de alcohol, nada de café, nada de bebidas gaseosas, y recien ahora estoy viendo algunas cosas como tomate de a poco y bueno los años no vienen solo; ademas el tema del coronavirus, no nos ha permitido salir nada lejos; lo único probable es que a fines de febrero nos vayamos hasta Punta Colorada bien cerca de Piriapólis con unos familiares veteranos todos muy divertidos y habra que aguantarse, eso si al no tener que ahorrar para padsear le estamos dando una limpieza a nuestra casa que esta cerca de cumplir 100 años asi que en algo hay que entretenerse , un abrazo muy Grande para toda la familia de Matraqueando y otro bien grandote para ti y tu familia, Feliz Navidad, y esperemos que que toda mala onda se acabe son los deseos de Graciela y Carlos desde el paisito de Montevideo, Uruguay besos y FELIZ AÑO 2021

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