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A terrível viagem de ônibus entre Porto Seguro e Itacaré

A distância entre Porto Seguro e Itacaré é de apenas 370 km. Ainda assim, as passagens indicavam que estávamos perto de encarar 8 horas de viagem. A primeira coisa que eu me perguntei foi que rota maluca o motorista ia fazer. “Deve ser algum erro”, pensei, enquanto me acomodava na minha poltrona.

A resposta para o mistério veio nos primeiros quinze minutos de estrada. Assim que saiu da área urbana de Porto Seguro, o ônibus parou. Olhei pela janela para tentar descobrir o motivo. Estávamos em um ponto de ônibus e algumas famílias embarcaram. Normal. O ônibus da Viação Cidade Sol não estava completamente cheio e eles se acomodaram nas poltronas vazias.

O problema foi que isso aconteceu durante os 370 km de trajeto. A cada ponto de ônibus, o veículo parava para recolher os passageiros que esperavam na beira da estrada. Aos poucos o ônibus ficou lotado. Ainda assim, pessoas continuavam entrando e descendo de lá. Quero deixar claro que esse não era um ônibus interurbano, dessas lotações que levam de um lugar para o outro e nas quais um certo número de pessoas em pé é aceitável. Era um ônibus rodoviário, com cadeiras estofadas e reclináveis e para o qual eu e outros passageiros que saíram da rodoviária pagamos preço equivalente. Isso quer dizer que a empresa cobrava o serviço de transporte rodoviário, mas oferecia o de lotação.

Quando eu me recordo dessa viagem, acredito que ela foi uma das piores da minha vida. O calor insuportável e a ausência de ar-condicionado ajudaram, confesso, mas o principal motivo foi, sem dúvida, a revolta que eu senti com a situação na qual os outros passageiros foram submetidos.

Eram pessoas simples, que possivelmente não tinham noção da falta de segurança a que estavam se sujeitando e do absurdo que era serem obrigados a enfrentar horas de viagem em pé, fossem eles velhos, grávidas ou pessoas com (às vezes várias) crianças pequenas.

Acredito que eles aceitavam aquele tipo de situação por não haver alternativas de transporte público, mas não tinham a menor consciência do direito que eles adquiriam no momento em que pagavam suas passagens: em ônibus rodoviários, os lugares devem ser marcados e é proibido o transporte de passageiros em pé.

E isso não é uma proibição leviana: alguns dias depois,  um ônibus que transportava passageiros exatamente da mesma forma sofreu um acidente que resultou num número grande de mortos e feridos, principalmente entre os que estavam em pé. A notícia apareceu em todos os noticiários da Bahia. Ou seja, ao agir de forma imprudente e gananciosa, colocando gente até não caber mais dentro de um ônibus de viagem, a empresa colocou também a vida dessas pessoas em risco.

Mas o descaso não parou por aí. Ao chegarmos ao nosso destino, um dos funcionários da Cidade Sol que deveria ser responsável pela entrega das malas abriu o bagageiro. Ele começou a atirar tudo o que estava lá dentro no chão, sem o menor cuidado com os pertences dos passageiros.

Um casal de estrangeiros que havia viajado no mesmo ônibus começou a gesticular freneticamente para ele. Possivelmente a mala deles estava sendo soterrada por um monte de outras bagagens que o senhor educação atirava em cima. Além disso, ele não queria nem se dar ao trabalho de conferir os canhotos para saber se as pessoas estavam levando a mala certa para casa.  Quando questionei se ele não ia fazer isso, ele disse:

– Você não consegue reconhecer a sua mala não?

– Eu consigo, mas como vou saber se ninguém levou ela pra casa numa das duzentas paradas que a gente fez se o senhor não quer fazer seu trabalho direito?

– Era só o que me faltava!

Minha vontade era de soltar um palavrão dos feios, mas peguei minha mochila e segui meu caminho, jurando que nunca mais ia entrar num ônibus da Viação Cidade Sol outra vez. Eu também queria ter ajudado os gringos, mas como eu nunca tinha conversado com ninguém em inglês fora da sala do cursinho, eu senti vergonha de falar com eles.

Isso também me fez pensar como alguns setores do turismo brasileiro são completamente despreparados para lidar estrangeiros. Não é a toa que, apesar de sermos considerados um dos países mais interessantes quando se fala de atrações naturais, não estamos nem entre os 30 países mais visitados do mundo.

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Natália Becattini

Sou jornalista, escritora e nômade. Viajo o mundo contando histórias e provando cervejas locais desde 2010. Além do 360meridianos, também falo de viagens na newsletter Migraciones, no Youtube e em inglês no Yes, Summer!. Vem trocar uma ideia comigo no Instagram. Você encontra tudo isso e mais um pouco no meu Site Oficial.

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20 comentários sobre o texto “A terrível viagem de ônibus entre Porto Seguro e Itacaré

  1. Ainda bem que li esse post, vi que a empresa Rota transportes faz o serviço de transporte de passageiros nesse roteiro, até pensei em comprar por lá, mais preferi ir de buser e gostei muito.

  2. A Empresa Fretcar que faz a linha Fortaleza x Flecheiras e Mundaú, se comporta do mesmo jeito a única diferença e que o ônibus tem ar condicionado, inclusive fui em um horário que coincidiu com os estudantes de escolas pegando o ônibus para voltar para casa.

    Obs: Na volta o ar condicionado quebrou e foi um perrengue grande!

  3. oi natalia,parabens pra vc,sou português,moro em s.p mais concretamente em guarulhos,juntinho a pista do alt de Guarulhos.fazendo da suas palavras minhas,e difícil e constrangedorentender o desempenho de certas pessoas que não tem capacidade para trabalhar em certos setores,continuam lá como se nada fosse .Por isso hoje eu entendo porque no BRasil há os muito ricos e o muito pobres,pois embora haja que diga qUE há classe média,esta é sim mediana.É pior hoje perdeu se o respeito pelo ser humano.

  4. natalia, to gostando muito do seu blog, parabens a vc e aos seus colegas, mais falando sobre a noticia, moro em teixeira de freitas, bem proximo de porto seguro e realmente aqui as empresas de onibus são desse jeito, quase todas, é uma vergonha para a minha região mais toda manifestaçao é falada a mesma coisa: a maioria das empresas de onibus daqui são familiares de um politico que é o PRESIDENTE da agerba, então ja viu ne…

    1. Ei Gleiton, é uma tristeza essas companhias mesmo! Infelizmente ficamos nas mãos desses serviços caros e de péssima qualidade. Abraços e obrigada por passar por aqui.

  5. Também viajei pra Itacaré com a cidade Sol, é um compania vergonhosa! Vi vários israelís preocupados com o sobe e desce de tanta gente. A parte do desconforto, nao é nada seguro. Pra fazer esse trajeto, recomendo a Viacao Aguia Branca que só para nas rodoviárias.
    Abraço!

    1. Valeu pela dica, Laise. Nós só sabíamos que a o trajeto com a Cidade Sol era ruim. É bom saber que existe uma alternativa melhor.

      Abraço!

  6. É realmente muito ruim, mas há algumas alternativas, inclusive de ônibus com mais conforto e que so param em rodoviárias, já passei por essa tambem, viajar pelo interior da Bahia é extremamente complicado.

    1. Ei Ian. Bom saber que existem outras companhias, porque com essa que eu citei no post eu não viajo mais. Muito descaso e desrespeito com as pessoas! =)

      Abraços!

      1. Vou fazer o trajeto:
        porto seguro > itacaré
        itacaré > valença > morro de são paulo
        Valença > porto seguro.

        Gostaria de saber se puderem me ajudar, quais as melhores companhias de onibus que fazem esse trecho.

        Obrigadooo

        1. Oi Vagner,

          Na época em que fizemos essa viagem, há quase três anos, a única opção que achamos para os trechos Porto Seguro – Itacaré e Itacaré – Valença era a Viação Cidade do Sol. O relato da viagem é esse que você leu no post: definitivamente ruim. Não sei se alguma coisa mudou de lá pra cá.

          O blog Viaje na Viagem tem um relato completíssimo sobre como circular de ônibus nessa região. Acho que vale você dar uma lida:

          https://www.viajenaviagem.com/2010/02/resumindo-de-onibus-pela-costa-do-dende/

          Qualquer coisa volte a perguntar!

          Abraço!

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